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Preço das Ações na Oferta Pública por Alienação de Controle de Companhia Aberta

Preço das Ações na Oferta Pública por Alienação de Controle de Companhia Aberta

Preço das Ações na Oferta Pública por Alienação de Controle de Companhia Aberta

(Versão original do artigo publicada na obra coletiva HANSZMANN, Felipe (Org.). Atualidades em Direito Societário e Mercado de Capitais. Volume III. Rio de Janeiro. Lumen Juris, 2018.)

Paulo Eduardo Penna

dez.2018

SUMÁRIO: 1. Introdução: a regra do preço de aquisição das ações dos minoritários na OPA por alienação de controle no art. 254-A – 2. Atualização do preço pelo custo de oportunidade – 3. Venda das ações do controle com pagamento a prazo ou com earn-out – 4. Alienação do controle com preço acordado em moeda estrangeira – 5. Alienação do controle por meio de um conjunto de operações e por etapas – 6. Determinação do preço na alienação de controle indireto – 7. Assunção do risco de materialização de passivos pelo alienante do controle – 8. Alienação de controle mediante permuta de valores mobiliários e outros bens – 9. Venda das ações do bloco de controle por preços diferenciados – 10. Problema da manipulação do preço da oferta: venda conjunta de ações preferenciais sobrevalorizadas e outros casos – 11. OPA unificada visando a mais de uma das finalidades previstas na Instrução 361/02 – 12. Aquisição de ações durante o período da OPA – 13. Código Brasileiro de Governança Corporativa e considerações finais.

1. Introdução: a regra do preço de aquisição das ações dos minoritários na OPA por alienação de controle no art. 254-A

O art. 254-A da Lei 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (Lei de Sociedades Anônimas ou, simplesmente, “LSA”), estabelece que, na alienação onerosa do controle de companhia aberta, o adquirente do controle tem o dever de realizar uma oferta pública para a compra das ações votantes dos acionistas minoritários.[1]

Reconhecendo que as ações que, em conjunto, conferem ao seu titular o poder de comandar as atividades empresariais são mais valorizadas do que as demais, a LSA exige que parte do preço recebido pelo controlador alienante seja dividido com os minoritários, conferindo a estes o direito de saída conjunta, também denominado de tag along right, atingido por meio da oferta pública de ações obrigatória: a OPA por alienação de controle.

Como previsto no caput do art. 254-A da LSA, os minoritários que aceitarem vender suas ações na OPA por alienação de controle terão direito a receber preço unitário igual a, no mínimo, 80% (oitenta por cento) do valor pago ao alienante por ação integrante do bloco de controle. Em outros termos, o adquirente do controle está obrigado a formular uma oferta pública para aquisição das ações dos minoritários votantes por preço correspondente ao valor pago por ação do controlador (ou grupo controlador), com um deságio de 20% (vinte por cento). O art. 254-A consagra a socialização parcial do prêmio de controle. Tomando-se como referência o valor unitário que deverá ser pago aos minoritários, o controlador receberá, por ação, montante 25% (vinte e cinco por cento) superior. Do ponto de vista do adquirente do controle o direito ao tag along exige que, na avaliação de oportunidade de compra, seja considerado não somente o preço a ser pago ao controlador, mas também o potencial custo de aquisição das ações dos minoritários.

Não é tecnicamente apropriado afirmar que o controlador faz necessariamente jus a 20% (vinte por cento) do prêmio de controle, como por vezes é propagado. O prêmio de controle corresponde à diferença entre o valor econômico das ações – que, podemos pressupor, equivale ao valor de negociação das ações no mercado – e o valor pago pelo adquirente do controle. O controlador tem direito exclusivo a receber uma parcela de 20% (vinte por cento) do preço total pago pelo adquirente. Se o valor do preço de venda das ações do bloco de controle superar em até 25% (vinte e cinco por cento) o valor de mercado das ações, o controlador alienante embolsará, com exclusividade, todo o prêmio de controle;[2] se o primeiro valor superar o valor de mercado das ações em mais de 25% (vinte e cinco por cento), parte do prêmio de controle será destinado aos minoritários que aceitarem vender suas ações na OPA.

Embora atualmente a lei consagre o pagamento de um preço menor para os minoritários, nem sempre foi assim. Quando promulgada em 1976, a LSA, por meio do seu art. 254, estabelecia que, ocorrendo a alienação de controle, o adquirente do controle estava obrigado a lançar oferta pública para aquisição das ações dos minoritários, por preço igual ao valor, por ação, pago ao controlador alienante. O minoritário, assim optando, poderia exercer o seu direito de saída conjunta, vendendo ao adquirente as suas ações por valor igual àquele pago ao controlador.

A regra da socialização total do prêmio de controle vigorou no País por duas décadas. Em 5 de maio de 1997, promulgou-se a Lei 9.457, que, ao empreender uma espécie de “minirreforma” da LSA, revogou o art. 254, pondo fim à obrigação da realização da OPA por alienação de controle. Na época, o Governo Federal avançava no projeto de privatizar as empresas estatais, uma das bases da política macroeconômica então em força. Encontrava-se, pois, na posição de alienante de controle. A revogação do art. 254 da LSA permitiu ao Governo vender as empresas estatais apropriando-se da totalidade do prêmio de controle.

Quatro anos mais tarde, diante dos reclamos por uma maior proteção dos minoritários, como um meio de fortalecer o combalido mercado de capitais brasileiro, foi promulgada a Lei 10.303, de 31 de outubro de 2001, que, entre outras alterações na LSA, introduziu o art. 254-A, restaurando o direito de saída conjunta dos acionistas minoritários, mas prevendo, dentre outras alterações, que o preço a ser pago aos minoritários deverá corresponder a, no mínimo, 80% (oitenta por cento) do preço pago por ação do bloco de controle.[3]

Ao mencionar que o preço será “no mínimo” igual a 80% (oitenta por cento), o art. 254-A admite que o adquirente possa fazer oferta por preço superior. A rigor, tal menção não seria necessária, já que nada impede que o ofertante faça a oferta por valor mais elevado, em evidente benefício dos minoritários.

A aquisição das ações dos minoritários por preço superior também pode ser consagrada em disposição estatutária. É o que ocorre nos segmentos especiais de listagem do Novo Mercado e do Nível 2 da B3, que impõem às companhias neles listadas uma regra de tag along mais vantajosa para os acionistas minoritários do que aquela consignada no art. 254-A da LSA. Tanto no Novo Mercado, que, desde sua criação se tornou o segmento mais popular para aberturas de capital no Brasil, quanto no Nível 2 da B3, as companhias devem prever em seus estatutos que a OPA por alienação de controle deve ser realizada por preço igual ao valor por ação pago ao controlador alienante. Lembre-se que no Nível 2 as companhias podem ter ações votantes e não votantes. A regra da socialização total do prêmio de controle, nesse caso, aplica-se a todas as ações da companhia, incluindo as preferenciais sem voto ou com voto restrito. No mais, ainda que não esteja listada em segmento especial da B3, uma companhia aberta pode, por disposição estatutária, atribuir aos preferencialistas não votantes o direito de participar da OPA por alienação de controle.

O cálculo do preço da OPA não suscitará maiores questionamentos quando se tratar de alienação do controle direto efetivada por meio da compra de ações ordinárias do controlador vendedor, mediante pagamento do preço em moeda corrente nacional, à vista, simultaneamente ao pagamento do preço da OPA aos minoritários que a ela aderirem, sem a assunção de obrigações adicionais de parte a parte. Nessas situações, basta aplicar o percentual de 80% (oitenta por cento) sobre o valor pago por ação do controle – valor este facilmente calculável mediante a simples divisão do valor total da operação pelo número de ações alienadas – para se chegar ao preço unitário a ser atribuído às ações objeto da OPA. Nas companhias do Novo Mercado e do Nível 2 nem esse cálculo simples é preciso fazer: o preço a ser oferecido aos minoritários será o mesmo pago por ação do bloco de controle.

Em muitas outras situações, porém, o cálculo do preço das ações na oferta não será tão fácil, exigindo certos ajustes, de modo a tornar efetivo o tratamento equitativo entre todos os acionistas votantes, isto é, o alienante do controle e os minoritários.

De fato, dentro do limite de 80% (oitenta por cento) previsto no art. 254-A da LSA, deve-se respeitar o tratamento equitativo entre todos os acionistas votantes. A concessão desse tratamento equitativo entre alienante e minoritários votantes é justamente o princípio orientador para resolver as várias questões complexas que podem surgir no cálculo do preço. Será imperativo fixar previamente o preço e condições que observem a paridade, fazendo-se os ajustes necessários, para, em seguida, como passo final, quando não houver disposição estatutária diversa, aplicar sobre eles o percentual de 80% (oitenta por cento) previsto no art. 254-A.

A Instrução 361, de 5 de março de 2002, da Comissão de Valores Mobiliários – CVM (“Instrução 361/02”), que regula o art. 254-A da Lei 6.404/76, não continha em sua redação original qualquer regra a respeito da determinação do preço das ações na OPA, salvo em relação ao preço na alienação de controle indireto. Essa situação mudou em 2010, quando a CVM baixou a Instrução 487, de 25 de novembro de 2010 (“Instrução 487/10”), incorporando à Instrução 361/02 regras sobre a definição preço da OPA, muitas das quais já tinham sido consolidadas em decisões do Colegiado da CVM. Examinamos tais regras ao longo do presente artigo.

No exame do pedido de registro da OPA por alienação de controle, a CVM deverá se certificar que os minoritários não estão sendo lesados, recebendo menos do que 80% (oitenta por cento) do valor pago por ação do bloco de controle. Não cabe à Comissão examinar a conveniência do negócio que resultou na alienação de controle, nem tampouco verificar se as condições avençadas entre o alienante do controle e o adquirente são justas e se o preço efetivamente reflete o valor econômico da participação adquirida. As partes do contrato que resultar na alienação de controle têm liberdade para fixar o preço e a forma de pagamento do modo que lhes for mais conveniente. Podem, nesse contexto, estabelecer que o preço será pago de forma parcelada, contratar o pagamento de preço adicional atrelado ao desempenho futuro da companhia, prever a indenização do adquirente por dívidas que venham a se materializar, enfim, estruturar o negócio de variadas formas, atendendo às suas conveniências. Demais disso, a alienação de controle pode ocorrer de outra forma que não uma mera compra e venda de ações. Tendo como ponto de partida os termos e condições em que se deu a alienação de controle, a CVM deverá revisar a minuta do edital da OPA proposta pelo adquirente do controle, a fim de conferir se o valor e as condições garantem, aos acionistas minoritários, tratamento equitativo. Não sendo respeitado esse princípio, caberá à CVM rejeitar o pedido de registro da OPA, negando autorização para a alienação do controle da companhia aberta.

Examinamos a seguir as situações específicas em que a definição do preço na OPA pode exigir outros ajustes além da mera aplicação do percentual de 80% (oitenta por cento) sobre o valor pago por ação do bloco de controle.

2. Atualização do preço pelo custo de oportunidade

A situação mais corriqueira em que será preciso fazer um ajuste no preço das ações na OPA ocorrerá quando a oferta constituir uma condição resolutiva, e o pagamento do preço ao controlador alienante for realizado à vista, portanto antes do efetivo lançamento da oferta.

Considerando que o pedido de registro de OPA deve ser submetido à CVM em até 30 (trinta) dias a contar da celebração do instrumento definitivo de alienação de controle, e em vista dos prazos previstos na Instrução 361/02 para que a autarquia aprecie o pedido e o leilão seja efetivado,[4] entre a data do pagamento do preço de controle ao controlador alienante e a data do pagamento do preço da OPA aos minoritários pode transcorrer mais de 90 (noventa) dias. Se a CVM, na análise do pedido de registro, vier a formular exigências, o prazo pode ultrapassar 150 (cento e cinquenta) dias.

A simples aplicação da fórmula de 80% (oitenta por cento) a casos como esse representaria uma quebra do tratamento equitativo, uma vez que o alienante terá recebido o pagamento antes dos minoritários. Essa questão será ainda mais intensa quanto maiores o prazo, os juros no mercado financeiro e a inflação. É necessário contrabalançar esse benefício antecipado com uma compensação no valor a ser pago, postergadamente, aos minoritários.

O tratamento equitativo, pois, será atingido pela atualização do valor pago ao alienante do controle, mediante a aplicação de taxa que reflita o custo de oportunidade do investidor. Esclarece Roberta Nioac Prado: “sempre que o acionista controlador receber o pagamento pelo bloco de ações de controle antes da liquidação da OPA com os acionistas minoritários que a aceitarem, o preço ofertado a estes últimos deverá ser corrigido e acrescido dos juros legais até a data do pagamento”.[5]

Embora esse tema não estivesse tratado na Instrução 361/02, a CVM firmou o entendimento de que o preço das ações na OPA deveria ser atualizado por índice que refletisse o custo de oportunidade do investidor.[6] O exame de alguns dos editais aprovados pela CVM demonstra que a autarquia inicialmente não se prendeu a uma única métrica, tendo autorizado como índice de atualização da oferta por alienação de controle a variação do IPCA mais 6% (OPA da Magnesita Refratários),[7] 100% do CDI (OPA da Amazônia Celular)[8] e a taxa Selic (OPA da GVT Holding).[9]

Apesar de ter autorizado a adoção de índices diversos, a CVM terminou reconhecendo, nos termos da orientação da área técnica da CVM no Processo CVM RJ 2008/7781,[10] que a taxa Selic seria o principal índice de referência. Por meio de alteração promovida na Instrução 361/02 pela Instrução 487/10, esse entendimento se tornou norma. Conforme constou da justificativa da Instrução 487/10, a taxa Selic foi escolhida “por ser considerada representativa da taxa livre de risco da economia”.

Atualmente, portanto, consoante estabelece o § 7º do art. 29 da Instrução 361/02,[11] nas alienações com pagamento em dinheiro, o preço da OPA deverá ser acrescido de juros à taxa Selic (ou, caso esse índice deixe de ser divulgado por outra taxa que venha a substituí-la), desde a data do pagamento do preço ao controlador alienante até a data da liquidação financeira da OPA.

3. Venda das ações do controle com pagamento a prazo ou com earn-out

O contrato de alienação do controle pode consignar que o preço de compra das ações do bloco de controle será pago a prazo, de forma parcelada.

Em situações como essa, a Resolução 401, de 22 de dezembro de 1976, do Conselho Monetário Nacional, que, à época, regulava o ora revogado art. 254 da Lei 6.404/76 (“Resolução 401/76”), previa que, na OPA por alienação de controle, o adquirente do controle teria a opção de pagar aos minoritários à vista, em valor equivalente ao preço unitário contratado com o alienante, descontado à taxa de juros vigente no mercado financeiro.[12] A decisão por pagar o valor à vista cabia ao adquirente do controle.

A adoção desse procedimento, por um lado, é neutra do ponto de vista financeiro para os minoritários e, por outro, pode se mostrar útil para o ofertante. Os minoritários receberão um montante por ação equivalente ao que será pago ao alienante no futuro, apenas ajustado em razão da antecipação do seu pagamento. De certo modo, é uma alternativa mais vantajosa para os minoritários, que poderão desde logo dispor do numerário obtido com a venda das ações na OPA como lhes convier. Dependendo do número de parcelas avençado, o valor de cada parcela por ação pode ser muito baixo, tornando o pagamento parcelado um procedimento laborioso e oneroso para o adquirente do controle, principalmente quando o número de ações objeto da OPA for pequeno ou quando houver minoritários detentores, individualmente, de poucas ações. Nesse contexto, normalmente o ofertante preferirá pagar antecipadamente aos minoritários, de modo a não ter que manter ativa toda uma estrutura de pagamento parcelado, pelo prazo previsto no contrato de cessão de controle.

Se o próprio contrato de alienação de controle previr a incidência de juros nas parcelas a serem pagas de forma diferida, e sendo tais juros compatíveis com aqueles praticados no mercado financeiro, o tratamento equitativo será atingido mediante o simples pagamento à vista da soma de todas as parcelas do preço unitário de venda das ações. No entanto, na hipótese de os juros contratuais serem superiores aos juros de mercado, será preciso calcular o valor futuro das parcelas, com a incidência dos juros mais altos, e em seguida trazê-las a valor presente com base nos juros de mercado.

Comentando o tema do pagamento parcelado, Luiz Leonardo Cantidiano recomendou incluir na regulamentação do art. 254-A da LSA, na época ainda não expedida pela CVM, a possibilidade de o adquirente optar por pagar à vista o preço aos minoritários, com o desconto dos juros, em vez de ter que pagar a eles de forma parcelada, como avençada com o alienante do controle.[13]

A Instrução 361/02, todavia, não tratou do assunto, de modo que, não obstante as considerações acima, quando o preço da aquisição do controle é a prazo, o adquirente estará obrigado a formular OPA para, de igual forma, pagar o preço aos minoritários também a prazo.

O art. 4º, § 1º da Instrução 361/02,[14] situado na parte geral da instrução, aplicável a todas as OPAs, dispõe que a oferta poderá ter preço à vista e a prazo distintos para os mesmos destinatários, desde que a escolha caiba ao minoritário e não viole outros dispositivos do normativo. Admite-se que o adquirente do controle apresente as duas formas de pagamento do preço, podendo o minoritário escolher entre uma ou outra. No mesmo sentido, assim discorre Rodrigo Marcilio:

“entendemos que o ofertante deve, sempre e em qualquer caso, oferecer aos destinatários da oferta a mesma condição de pagamento ajustada com o alienante do controle e, adicionalmente, facultar aos demais acionistas da companhia aberta a possibilidade de aderir à oferta recebendo o preço de forma diferenciada (à vista ou a prazo, conforme o caso), sendo que tal escolha caberá sempre ao destinatário da oferta pública”.[15]

Desse modo, o adquirente do controle estará obrigado a oferecer a possibilidade de pagamento parcelado, ajustado, obviamente, ao limite de 80% (oitenta por cento) previsto no caput do art. 254-A da LSA, podendo, caso queira, também oferecer a opção de pagamento à vista.[16]

Em preços sujeitos a parcelamento, o pagamento das parcelas vincendas é frequentemente assegurado por garantia prestada pelo adquirente (ou por outra pessoa a ele vinculada). Nessa hipótese, as garantias prestadas em favor do alienante do controle deverão ser estendidas aos minoritários, em cumprimento à exigência de concessão de tratamento equitativo. Exemplificativamente, caso o pagamento das parcelas vincendas seja objeto de carta de fiança emitida por instituição bancária, igual garantia deve ser conferida aos minoritários que optarem por vender suas ações a prazo na OPA.[17]

O pagamento ou até mesmo o valor de parcela do preço pode estar condicionado a evento futuro e incerto, em razão da ocorrência de algum fato positivo ou da não materialização de circunstância negativa (por exemplo, a falta de concretização de determinada contingência). É comum, em empresas com alto potencial de crescimento ou quando há relevantes divergências entre o adquirente e o alienante do controle a respeito da avaliação da companhia em função das expectativas quanto ao seu desempenho futuro, que parte do preço fique atrelado à sua performance futura, tipo de arranjo conhecido como cláusula de earn-out.[18] Nessas situações, em observância ao tratamento equitativo, o potencial pagamento futuro deverá ser colocado à disposição dos minoritários na OPA, observado o deságio de 20% (vinte por cento).

4. Alienação do controle com preço acordado em moeda estrangeira

Quando a ponta vendedora ou compradora do negócio da alienação de controle tiver domicílio no exterior, o valor de compra das ações do bloco de controle poderá ser eventualmente contratado em moeda estrangeira.

Lembre-se que, de acordo com a legislação brasileira (Decreto-Lei 857, de 11 de setembro de 1969), são nulas as obrigações exequíveis no País que estipulem pagamento em moeda estrangeira, exceto em algumas situações específicas, quando, por exemplo, o credor ou devedor seja domiciliado no exterior. Ademais, as leis que implementaram o Plano Real (Lei 8.880, de 27 de maio de 1994, e Lei 10.192, de 14 de fevereiro de 2001) proíbem a utilização de cláusula de indexação à variação cambial (a chamada cláusula cambial), salvo em contratos internacionais ou contratos internos decorrentes de contrato internacional ou a ele atrelado.[19] Daí por que uma alienação de controle só poderá ser contratada em moeda estrangeira, ainda que o pagamento seja feito em moeda nacional, se o alienante ou o adquirente não for domiciliado no Brasil.

Nesses casos, o valor em moeda estrangeira deverá ser convertido para moeda nacional, segundo a taxa de câmbio do dia do seu pagamento ao alienante do controle. O preço da ação na OPA corresponderá, pois, a 80% (oitenta por cento) do preço unitário em moeda estrangeira pago ao alienante do controle. Ocorrendo um lapso de tempo entre a data de conversão e o efetivo pagamento do preço aos minoritários, o valor em moeda nacional resultante da conversão deverá ser atualizado pela taxa Selic, conforme visto no item 2 acima.

Nioac Prado defende que a taxa de conversão da moeda na data do pagamento deve ser a taxa de venda da moeda estrangeira, sob o argumento de que o minoritário deveria poder comprar, com o valor recebido em moeda nacional, o mesmo quantum pago ao alienante em moeda estrangeira.[20]

A nosso ver, a definição da taxa de conversão – se de venda ou de compra – não é tão simples e depende das circunstâncias em que o negócio foi realizado, de modo a não prejudicar os minoritários, mas também não sobrecarregar o adquirente indevidamente. Se o adquirente for domiciliado no Brasil e o alienante no exterior, o pagamento do preço demandará a compra de moeda estrangeira para sua remessa ao exterior. Não há dúvidas de que, nesse caso, a taxa de conversão para fins do cálculo do preço da OPA será a mesma utilizada pelo adquirente na remessa: taxa de venda de moeda estrangeira.

Na situação inversa, em que o alienante for domiciliado no Brasil e o adquirente no exterior e este remeter moeda estrangeira ao Brasil, o montante remetido será convertida em moeda nacional pela taxa de compra de moeda estrangeira. Como o pagamento é feito em moeda nacional, a rigor nem é preciso usar uma taxa de conversão, já que o cálculo do preço da OPA pode ser realizado a partir do montante em Reais efetivamente recebido pelo alienante.

Há, porém, uma terceira situação, comum sobretudo quando o alienante e adquirente são domiciliados no exterior, em que o pagamento é feito sem a entrada de divisas no País. O emprego da taxa de câmbio de venda não é a melhor solução, porque obrigará o adquirente a despender, em relação a cada ação dos minoritários, um valor superior a 80% (oitenta por cento) do valor pago por ação do bloco de controle. A par disso, não nos parece que é obrigação do adquirente garantir ao minoritário um quantum que possa em seguida ser convertido em moeda estrangeira, sem qualquer perda de valor em relação ao montante pago ao alienante. A diferença entre a taxa de compra e a taxa de venda constitui a remuneração da instituição responsável pelo câmbio. Não vemos como imputar esse custo exclusivamente ao adquirente do controle. Em casos como este, parece-nos que a solução mais adequada será recorrer a uma taxa de conversão cambial correspondente à média entre as taxas de venda e de compra.[21]

5. Alienação do controle por meio de um conjunto de operações e por etapas

A alienação de controle de companhia aberta pode ocorrer por meio de um conjunto de operações, realizadas simultaneamente ou espaçadas no tempo (alienação por etapas).

Nesses casos, o pagamento pela alienação de controle pode estar distribuído, até de forma desproporcional, entre as várias operações. O preço das ações na OPA deverá levar em conta todas as operações em que tenha havido pagamento, segundo o seu peso relativo para a completude da alienação de controle. Como ensina Fábio Ulhoa Coelho, caberá “fixar-se o preço da oferta por médias ponderadas, de forma a assegurar ao minoritário o mesmo ganho que teria se todos os negócios de que resultou a alienação do poder de controle tivessem se concentrado num único”.[22]

O cálculo do preço da OPA não se prenderá, assim, ao valor da última operação ou mesmo à operação que tenha o valor mais elevado.[23] Tendo em vista que a alienação de controle decorre do conjunto de operações, o preço da oferta também deve ser fixado por esse conjunto. Nesse sentido, todos os diferentes preços pagos pelas ações do bloco de controle em cada uma das etapas devem ser atualizados pela Selic, em linha com o que examinamos no item 2 acima.

A CVM examinou essa questão recentemente no caso envolvendo a alienação de controle da companhia Somos Educação.[24] Havia, nesse caso, uma divergência se a operação de alienação de controle englobava duas etapas, como alegou o adquirente do controle, ou três etapas espaçadas ao longo de um intervalo de aproximadamente nove meses, como sustentou a área técnica da CVM (Superintendência de Registro de Valores Mobiliários– SRE).[25] Em decisão tomada na reunião realizada em 29.09.2015, o Colegiado terminou acompanhando o entendimento da SRE e determinou que o preço da OPA deveria corresponder à média ponderada dos diferentes valores pagos pelas respectivas quantidades de ações em cada uma das três etapas, corrigidos pela taxa Selic desde a data de cada aquisição até a data de liquidação financeira do leilão.

Nioac Prado levanta um caso hipotético inverso em que o controlador alienante transfere ao adquirente ações do bloco de controle em quantidade suficiente para atribuir a este a preponderância nas assembleias gerais, pelo seu valor de mercado, mas retém um número reduzido de ações, que são posteriormente transferidas ao mesmo adquirente, porém com um elevado ágio.[26] A alienação de controle ocorreu na primeira operação, caracterizando-se a segunda operação como um mero reforço de controle. É evidente, porém, que o prêmio de controle foi pago na segunda operação, possivelmente como tentativa de diminuir o preço das ações na oferta. De modo a evitar que os minoritários sejam prejudicados, o valor das ações na OPA deverá ser calculado levando em conta a média ponderada dos valores pagos nas duas operações.

6. Determinação do preço na alienação de controle indireto

Na medida em que se refere à alienação “direta ou indireta” de controle, o art. 254-A da LSA aplica-se tanto às alienações de controle direto, quando o acionista alienante é o controlador direto da companhia aberta, quanto às alienações de controle indireto, quando, entre o alienante e a companhia aberta, há outras interpostas sociedades. A fonte do poder, neste caso, decorre das relações societárias entre as sociedades que compõem o grupo econômico do alienante. Nesse sentido, a alienação do controle direto de uma sociedade controladora de uma companhia aberta, ou mesmo de qualquer outra sociedade mais acima na cadeia societária mas que, no final das contas, controle indiretamente a companhia aberta, ocasiona a transferência do controle indireto desta companhia, impondo ao adquirente do controle o dever de formular a OPA por alienação de controle.[27]

As sociedades detentoras de participações em outras sociedades são comumente chamadas de “sociedades holding” ou simplesmente “holdings”. Conforme ensina José Edwaldo Tavares Borba,[28] as holdings são classificadas em puras ou mistas. Holdings puras são aquelas que não exercem qualquer outra atividade que não seja a de deter participação e, conforme o caso, controlar as sociedades nas quais detêm participação. Já as holdings mistas, também chamadas de operacionais, além de deter participações em outras sociedades, praticam alguma atividade (comercial, industrial, financeira, etc.). Enfim, não são meras detentoras de ações ou quotas de outras sociedades.

Quando a alienação de controle indireto resultar da alienação do controle direto de holding pura, que tem como único ativo as ações do bloco de controle da companhia aberta e no lado passivo do seu balanço apenas o capital social e reservas, o cálculo do preço da OPA não representará um problema. Nesses casos presume-se que o preço de venda das ações ou quotas da holding corresponde ao preço de cessão do controle. O preço unitário das ações na OPA corresponderá a 80% (oitenta por cento) do preço pago pelas ações da holding (ou, no caso das companhias do Novo Mercado ou do Nível 2, ao preço “cheio”), dividido pelo número de ações votantes detidas pela holding na companhia objeto da oferta.

O cálculo do preço torna-se um desafio[29] – certamente uma das questões mais intrincadas em matéria de alienação de controle – quando a controladora é uma holding operacional, exercendo atividade própria, ou quando, mesmo sendo holding pura, detém investimentos em outras sociedades. A questão ganha contornos ainda mais dramáticos diante da transferência do controle de grupos multinacionais, espalhados por diversos países e integrados por companhias abertas e sociedades fechadas.

A alienação do controle indireto da companhia objeto da OPA não corresponderá, obviamente, ao preço de aquisição do controle direto da holding. Este, em princípio, refletirá a soma global dos ativos e passivos direta e indiretamente detidos pela holding, incluindo o controle indireto daquela companhia e a mais-valia representada pela organização, em um único veículo, de todas essas atividades e investimentos. Será preciso destacar do preço de aquisição global a parcela que corresponde às ações da companhia objeto. Em outras palavras, definir quanto do preço pago pelo adquirente ao alienante do controle equivale à participação societária e ao controle da companhia objeto. A questão se complica porque o preço pago pelo controle da holding não resulta necessariamente da soma de todos os seus ativos e passivos, mas de uma negociação global, em que a companhia objeto, e o seu valor, pode ou não ter um peso relevante.[30] Com efeito, o adquirente do controle pode estar interessado em ativos outros que não o controle dessa companhia ou, inversamente, atribuirá a este um peso desproporcional em comparação com os demais ativos da holding.

A despeito das dificuldades apontadas, o adquirente do controle indireto está obrigado a formular OPA para aquisição das ações dos minoritários da companhia objeto, sendo preciso, pois, fixar o preço unitário dessas ações.

O § 6º do art. 29 da Instrução 361/02[31] manda que, em casos de alienação de controle indireto, o adquirente submeta à CVM, juntamente com o pedido de registro, a demonstração justificada do cálculo do preço das ações na OPA (“DJP”), correspondente à alienação do controle da companhia objeto.[32]

Ainda que não muito usual, é possível que o contrato de alienação do controle, ou algum documento a ele subjacente, discrimine as parcelas do preço correspondente a cada um dos ativos direta e indiretamente envolvidos na operação, apontando, de forma explícita, o valor atribuído ao controle da companhia objeto. Sendo assim, este valor será a base para o cálculo do preço das ações dos minoritários na OPA, presumindo ter sido acordado de boa-fé pelas partes do contrato de alienação de controle. Nas palavras de Nelson Eizirik et al.:

a CVM deverá presumir que tal preço, expressamente informado pelo comprador e vendedor, efetivamente corresponde às ações da companhia indiretamente controlada, sem prejuízo da possibilidade de a autarquia, ao analisar determinado caso concreto, detectar a eventual ocorrência de práticas ilegais ou fraudulentas visando a reduzir artificialmente o preço da OPA”.[33]

Trata-se do mesmo princípio aplicável às alienações de controle direto, em que se presume que o preço constante do contrato reflete o acordo das partes, devendo, salvo prova em contrário, embasar o cálculo do preço das ações na OPA. Esse também foi o entendimento adotado pelo então Presidente da CVM, Marcelo Trindade, no exame do preço da aquisição do controle indireto da Arcelor Brasil:[34]

Como regra geral, deve prevalecer o entendimento de que a demonstração a que se refere a Instrução será considerada justificada se estiver baseada em documento que revele o preço que tenha sido contratualmente estabelecido entre comprador e vendedor, como correspondente às ações da controlada indireta, o qual deve ser respeitado, adotando-se tal valor como preço da oferta pelas ações da companhia controlada indiretamente. Essa é a mesma regra geral que incide quanto ao preço da aquisição nos casos de alienação direta de controle, e não existe razão para não respeitar a vontade das partes na alienação indireta, como na direta se respeita”.[35]

Em caso subsequente, envolvendo a alienação de controle de companhias do Grupo Ipiranga[36], o então Diretor Marcos Barbosa Pinto relativizou um pouco essa presunção, ao adotar a posição de que não se pode conferir “importância nem credibilidade excessivas” ao valor da companhia objeto indicado no contrato, advertindo que, em muitos casos “os valores que constam do contrato não são objeto de uma real negociação entre o adquirente e o alienante, já que, para este último, a distribuição do preço entre ativos indiretamente alienados pode ter pouca ou nenhuma relevância.

Não obstante as considerações acima, na prática empresarial, em geral alienante e adquirente do controle simplesmente apõem no contrato o valor global da operação, sem qualquer segregação do preço entre os ativos envolvidos. Assim, o ofertante terá que submeter à CVM uma demonstração justificada do preço das ações votantes na OPA, calcada em metodologia que permita identificar a parcela do preço global correspondente à companhia objeto.

A metodologia a ser empregada para essa avaliação dependerá das circunstâncias do negócio, devendo, de preferência, guardar algum elemento de conexão com o cálculo do preço global.

Foi o que ocorreu no Caso Arcelor Brasil, no qual o ofertante demonstrou que, ao menos em uma das fases de negociação, levou-se em conta, no cálculo do preço global do negócio de aquisição indireta do controle da Arcelor Brasil, o índice EBITDA.[37] Por esse motivo, na demonstração do cálculo do preço da OPA a ofertante baseou-se no EBITDA proporcional (comparando-se o EBITDA da Arcelor Brasil com o EBITDA da sua controladora, cujo controle direto foi adquirido pelo ofertante). Ao examinar o pedido de registro da OPA, a área técnica da CVM manifestou-se pela adoção de metodologia diversa, fundada nos preços de mercado das companhias envolvidas, apoiando-se no fato de que tanto as ações de emissão da Arcelor Brasil quanto as da sua controladora eram negociadas no mercado. O Colegiado da CVM afastou este entendimento e confirmou que a metodologia indicada pelo ofertante deve ser presumida adequada, salvo prova em contrário. Convém destacar o seguinte trecho do voto proferido pela relatora Maria Helena Santana, que resume a posição adotada pela CVM: “Portanto, como regra geral e em princípio, ao contrário do que afirmou a SRE, julgo que a CVM não tem poderes que lhe permitam definir a metodologia a ser usada na determinação desse preço, mesmo em alienações indiretas de controle”.

A conclusão da decisão proferida pela CVM nesse importante precedente, com a qual concordamos, é a de que não lhe competirá definir a metodologia a ser usada, mas apenas confirmar que a DJP submetida pelo ofertante é justificável, estando atrelada à formação do preço global do negócio. Com base nos meios dos quais dispõe, a CVM poderá ouvir o adquirente e o alienante de controle, examinar o contrato de alienação do controle e outros documentos e tomar outras medidas cabíveis com a finalidade de encontrar os elementos, dando suporte à metodologia escolhida.

Na falta de elementos que possam apontar a metodologia a ser usada, em princípio caberá ao ofertante, em vista das circunstâncias concretas, escolher a mais adequada. Não se nega o elevado grau de incerteza e subjetividade desse procedimento, sujeito a questionamentos e contestações de minoritários, mas é preferível adotá-lo do que definir um critério único aplicável a todos os casos de alienação de controle indireto. A CVM terá a função de verificar se a metodologia proposta pelo ofertante é justificável em face da operação e se esta está apta a, com observância do tratamento equitativo, mensurar o preço das ações na OPA. Por exemplo, se tanto a companhia objeto quanto a sua controladora forem sociedades com ações negociadas no mercado, ambas com elevado grau de liquidez, a técnica de comparação de preços de mercado provavelmente seria uma escolha apropriada.[38]

O laudo de avaliação da companhia objeto também poderá ser usado como elemento de suporte do preço na OPA por alienação de controle indireto. Em sua redação original, a Instrução 361/02 exigia do adquirente de controle a preparação de um lado de avaliação da companhia aberta para todos os casos de alienação de controle. O objetivo do laudo era fornecer aos acionistas minoritários elementos para a tomada de decisão a respeito da adesão à oferta. Com o passar do tempo, entretanto, a CVM concluiu que, na OPA por alienação de controle, o custo de elaboração do laudo era desproporcional ao benefício que trazia. Dessa forma, a Instrução 487/10 acabou com a exigência do laudo. No entanto, o inciso II do art. 8º da Instrução 361/02, introduzido pela Instrução 487/10, estabelece que, ao examinar o pedido de registro da OPA por alienação de controle indireto, a CVM pode exigir a apresentação de laudo de avaliação, em complemento à DJP. Segundo a justificativa da Instrução 487/10, o laudo de avaliação, nesse contexto, será usado para “efeitos de testes de consistência do demonstrativo do preço”.

Definida a metodologia, a CVM deverá se certificar de que a demonstração apresentada pelo ofertante está em conformidade com tal metodologia, e, em razão da sua implementação, que, da parte do preço por ação alocado para a companhia aberta em questão, ao menos 80% (oitenta por cento), por ação, esteja sendo oferecido aos minoritários, em respeito ao tratamento equitativo.

O tema do preço na transferência do controle indireto retornou à pauta do Colegiado da CVM por ocasião do pedido do registro da oferta por alienação do controle indireto de Millenium Inorganic Chemicals.[39] Nessa outra oportunidade, a CVM negou o pedido de registro da OPA por entender que a demonstração submetida pelo ofertante não estava justificada.

Recentemente o Colegiado da CVM voltou a enfrentar essa questão no emblemático caso envolvendo a alienação de controle indireto da CPFL Energias Renováveis S.A. (“CPFL-R”),[40] que, como bem observou Norma Parente, “retrata de forma interessante a dificuldade enfrentada pela CVM em aplicar o valor justa das ações em uma OPA por alienação indireta.”[41] A companhia chinesa State Grid. adquiriu o controle direto da companhia CPFL Energia S.A., que controlava diretamente não só a CPFL-R mas também outras dezoito companhias. Ao apresentar o pedido de registro da OPA, a State Grid ofereceu comprar as ações dos minoritários da CPFL-R pelo valor de R$ 12,20 cada. A consistência desse preço foi questionada tanto pelos minoritários quanto pela área técnica da CVM. Ao examinar o pedido de registro, a SRE avaliou que a DJP apresentada pela State Grid não empregou metodologia adequada e que o laudo de avaliação que também foi submetido pela ofertante continha premissas que não eram razoáveis. Entendeu, assim, não ser possível realizar o teste de consistência do preço calculado por meio da DJP e do laudo. Dessa forma, utilizando-se de critérios no seu entender “objetivos e baseados em dados isentos, existentes à época da [t]ransação”,[42] tendo como referência relatórios elaborados por analistas de mercado que avaliaram as duas companhias anteriormente, a SRE estabeleceu que o preço da OPA deveria ser elevado para no mínimo R$ 16,99, correspondente ao menor valor dentre aqueles que encontrou com base em tais critérios.[43] Na prática, fixou um preço mínimo que deveria ser observado na OPA por alienação de controle. O ofertante recorreu dessa decisão e a questão foi levada ao Colegiado.

A discussão no caso girou em torno de qual deve ser o limite de atuação da CVM na análise do cálculo do preço da OPA nas alienações de controle indireto. Seguindo o precedente da Arcelor Brasil, o Colegiado reafirmou que a CVM deve apenas verificar a existência da DJP e de sua razoabilidade, não podendo, rejeitar uma técnica de avaliação por não ser a que entende ser a melhor ou por não ser a utilizada com maior frequência. Assim, a CVM deve presumir que a escolha da metodologia feita pelo ofertante foi legítima e verificar se ela está coerente com a avaliação empregada na negociação da alienação de controle. Por fim, o Colegiado – a nosso ver corretamente – posicionou-se no sentido de que não cabe à CVM substituir o ofertante na tarefa de determinar e valor, ou mesmo uma faixa de valor, a ser utilizado na OPA por alienação de controle indireto, não havendo nada na lei ou na regulamentação que autorize a CVM a assumir tal função. Como apontou o Presidente Marcelo Barbosa em seu voto, é “larga a distância entre uma verificação de consistência da demonstração justificada do cálculo do preço da oferta e a determinação do preço em si, e não vejo como sequer encurtar tal distância sem incorrer em indevida interferência na esfera privada sem a necessária previsão em norma.

Em vista das conclusões a que chegou, o Colegiado reformou a decisão da área técnica da CVM em relação à fixação do preço mínimo da OPA por alienação de controle indireto da CPFL-R, mas exigiu que o ofertante reapresentasse a DJP com determinados ajustes que a área técnica considerou necessários para confirmar a consistência do cálculo do preço.[44]

Semelhantes incertezas na definição do preço na OPA poderão ocorrer nas alienações indiretas de controle, quando não há propriamente transferência de ações do bloco de controle, mas de outros bens e direitos que ocasionem a alienação de controle.[45] Também nessas situações o ofertante deverá apresentar à CVM uma demonstração do cálculo do preço das ações na OPA, se possível baseado em critério utilizado para a definição do valor de aquisição indireta do controle. Aplicam-se a esses casos, no tocante ao papel da CVM, as mesmas considerações feitas quanto às alienações de controle indireto.

7. Assunção do risco de materialização de passivos pelo alienante do controle

A celebração do negócio de alienação de controle é, em regra, precedida de auditoria (due diligence), que apontará os potenciais passivos da empresa que, vindo a se materializar, terão impacto na sua avaliação global. O risco de ter que suportar esses passivos, quando assumido pelo adquirente do controle, geralmente é refletido no próprio valor do preço de alienação de controle,[46] não apresentando problemas para o cálculo do valor da OPA.

É comum que o risco de materialização desses passivos seja total ou parcialmente assumido pelo alienante do controle, especialmente quando este e o adquirente divergem quanto à expectativa da materialização dos passivos. Há basicamente dois modos de estruturar essa assunção de risco: fixar-se um preço de venda à vista, com a previsão de pagamentos suplementares condicionados à não materialização dos passivos dentro de certo período de tempo (frequentemente atrelado ao prazo prescricional para a sua cobrança), ou pagar-se desde logo todo o preço ao alienante, tendo este a obrigação de devolver, no futuro, parte do preço, caso os passivos venham a se concretizar.

O primeiro modo, examinado no item 3 supra, não traz maiores problemas em relação à formulação da OPA. Como antes afirmado, o adquirente deverá garantir aos minoritários 80% (oitenta por cento), por ação, de tudo o que for pago ao alienante do controle. Logo, se o adquirente for obrigado a pagar ao alienante preço suplementar decorrente da não concretização de uma contingência, deverá estender tal benefício aos minoritários.

A segunda hipótese, pela qual o alienante assume a obrigação de, no futuro, devolver parte do preço pago, não é de fácil solução. Carlos Augusto Junqueira da Siqueira afirma que a obrigação assumida pelo alienante, de possivelmente ter que devolver parte do preço, não pode ser admitida para diminuir o valor a ser estendido aos minoritários, com base nos seguintes argumentos:

a obrigação diz respeito, claramente, aos alienantes do controle, que eram os gestores; as eventuais responsabilizações decorrem de atos de gestão aos quais os minoritários são alheios; o valor original do controle subsiste, pois não é modificado pela incidência de encargos que acionem a responsabilidade do ex-controlador”.[47]

Tais argumentos não nos parecem procedentes. Nem sempre o alienante do controle terá causado a contingência vinculada à eventual redução de preço. Além disso, não há que se confundir a posição de alienante, para fins de cálculo do preço da OPA previsto no art. 254-A da LSA, com a de administrador, para fins de imputação de responsabilidade por má gestão, ainda que sejam ocupadas pela mesma pessoa. Mesmo que o controlador alienante possa ser diretamente imputado pela ocorrência da contingência, essa responsabilização deve ser feita por via dos arts. 116 e 117 da LSA, e em princípio não deve impor sobre o ofertante um ônus adicional. Ademais, não nos parece relevante identificar se, em casos como esse, subsiste ou não o valor original do controle.

O art. 254-A da LSA trata do preço de forma global, exigindo do adquirente a realização de oferta de compra das ações dos minoritários por preço não inferior a 80% (oitenta por cento) do valor por ação pago ao alienante. Por conseguinte, o adquirente do controle deveria, em tese, repassar aos minoritários a redução no preço final pago ao controlador alienante, de modo que este não seja obrigado a pagar por ação objeto da OPA montante superior a 80% (oitenta por cento) do valor unitário pago por ação do bloco de controle. O problema é como arquitetar a oferta nesses termos, visto que simplesmente replicar, com os minoritários, o mecanismo de devolução de parte do preço avençado poderá não ser viável, do ponto de vista prático. A solução dependerá de uma análise das circunstâncias do caso, ressaltando o importante papel a ser desempenhado pela CVM na verificação de que o preço final a ser pago pelo adquirente respeita o tratamento equitativo.

Observe-se que, de todo modo, o adquirente do controle poderá, a seu critério, optar por oferecer aos minoritários o preço cheio (ajustado pela baliza de 80%), sem qualquer futuro desconto.

8. Alienação de controle mediante permuta de valores mobiliários e outros bens

A alienação do controle pode ser realizada por permuta, recebendo o alienante, em troca das ações do bloco de controle, valores mobiliários de outra companhia ou mesmo outros bens. De acordo com o princípio do tratamento equitativo que informa tal norma, o ofertante deverá oferecer aos minoritários, na OPA por alienação de controle, os mesmos bens entregues ao controlador alienante. Haverá, assim, uma oferta pública de permuta ou, caso parte do pagamento tenha sido feito em dinheiro, uma oferta mista.

A Instrução 361/02 dispõe, no § 1º do art. 33, que, como regra geral a qualquer oferta pública, só poderão ser ofertados em permuta valores mobiliários admitidos à negociação em mercados regulamentados brasileiros.

O § 8º do art. 29 da mesma instrução,[48] por sua vez, aplicável apenas às OPAs por alienação de controle, dispõe que, nesses casos, o adquirente do controle deve ofertar aos destinatários da oferta valores mobiliários da mesma espécie ou classe daqueles entregues ao acionista controlador.

Uma alienação de controle, entretanto, pode envolver a permuta por bens ou valores mobiliários não admitidos à negociação em mercados brasileiros (por exemplo, ações de uma companhia fechada): o alienante do controle não está obrigado a somente realizar permutas com valores mobiliários admitidos à negociação.  A Instrução 361/02 reconhece essa possibilidade e abre uma exceção no inciso I do § 1º anteriormente mencionado: caso o preço pago pelo adquirente do controle envolva bens ou valores mobiliários não admitidos à negociação, a CVM poderá admitir que a oferta pública de permuta ou mista seja liquidada com o pagamento desses bens em que sejam assegurados o tratamento equitativo e a adequada informação aos titulares das ações.

O referido § 8º, na sua parte final, faculta ao adquirente do controle formular oferta alternativa em dinheiro ou outros valores mobiliários, desde que a escolha caiba aos destinatários da oferta. A rigor, a realização de oferta alternativa será sempre uma opção do adquirente do controle, que deverá assegurar aos minoritários o tratamento equitativo. Embora tal parágrafo seja dirigido apenas às alienações que tenham como contraprestação valores mobiliários, a nosso ver a oferta alternativa pode ser proposta em quaisquer alienações de controle com pagamento em outros bens.

9. Venda das ações do bloco de controle por preços diferenciados

Situação instigante ocorrerá quando o alienante do controle for titular, além de ações ordinárias, de ações preferenciais com direito a voto e determinadas vantagens patrimoniais, e vier a vender ambas as espécies de ações, no bojo da alienação de controle, por preços diferenciados, com a atribuição de preço superior às preferenciais. Como as duas espécies de ações possuem direito a voto, ambas participam do bloco de controle. A dúvida é como será definido o preço de compra das ações dos minoritários, também de ambas as espécies: se deve haver dois preços distintos, um para cada espécie, ou se o preço deve resultar da média ponderada do preço pago pelo adquirente.

A solução mais adequada, em observância às diferenças existentes entre os destinatários da OPA (minoritários ordinaristas e preferencialistas votantes), e de modo a garantir o tratamento equitativo, seria a fixação de dois preços distintos, cada qual baseado no respectivo preço de compra das ações do bloco de controle da mesma espécie. Tal solução está em conformidade com a Instrução 361/02, cujo art. 4º, V, permite que a oferta seja lançada por preços diversos conforme a classe e espécie de ações, desde que compatível com a modalidade da OPA e haja justificativa para tanto.[49]

10. Problema da manipulação do preço da oferta: venda conjunta de ações preferenciais sobrevalorizadas e outros casos

É possível que o acionista controlador seja ao mesmo tempo titular de ações votantes, que lhe conferem o controle da companhia, e de ações preferenciais sem direito a voto, e, no negócio que resulta na alienação do controle, transfira para o adquirente ambas as espécies de ações.

Na vigência do art. 254 da LSA, a CVM identificou, em alguns casos em que ocorria a venda simultânea de ações ordinárias e preferenciais, um estratagema para diluir o preço das ações dos minoritários na OPA: as partes do contrato de alienação de controle inflavam artificialmente o preço das ações preferenciais e, em contrapartida, abatiam esse sobrevalor do preço das ações ordinárias.[50] Parte do prêmio do controle era embutido nas ações preferenciais, sem qualquer justificativa, eis que ações sem voto não têm como atribuir ao seu titular mando político. Para o alienante do controle não havia, em princípio, qualquer prejuízo, visto que recebia, no total, o mesmo valor pela venda do conjunto das suas ações. Todavia, a redução do valor das ações ordinárias ocasionava a redução do preço das ações na OPA por alienação de controle, em prejuízo dos minoritários.

Trata-se de fraude, tendo por objetivo tão somente reduzir o valor total a ser despendido pelo adquirente do controle na OPA.[51] O principal indício – porém, ressalva-se, não conclusivo – do uso desse artifício será a diferença substancial no preço de venda das ações preferenciais em relação ao seu respectivo valor de mercado.[52]

Evidentemente, dentro do princípio da autonomia da vontade, as partes têm liberdade para definir o preço, podendo até acordar que o preço das ações preferenciais será superior ao das ordinárias, principalmente por conta das vantagens econômicas atribuídas àquelas.[53] O que não se pode admitir é que o preço das ações preferenciais seja inflado com o escopo de fraudar a regra imposta pelo art. 254-A, que exige a observância do tratamento equitativo entre os acionistas votantes.

A CVM tem se mostrado atenta a essa questão no exame de pedidos de registro de OPA, quando tanto ações ordinárias como preferenciais são alienadas pelo mesmo valor. Nessa análise, em respeito ao princípio da autonomia da vontade, a CVM deve partir da presunção de que os preços avençados no contrato entre alienante e adquirente do controle são verdadeiros, ainda que venha a solicitar a apresentação de justificativa, como, aliás, confirma o voto proferido por Maria Helena dos Santos Fernandes de Santana no pedido de registro da OPA por alienação de controle da Trafo Equipamentos Elétricos:[54]

(...) neste caso concreto, o ‘preço por ação com direito a voto, integrante do bloco de controle’ foi contratualmente estabelecido em valor idêntico ao preço pelo qual a adquirente do controle comprou, também, as ações sem direito a voto detidas pelos acionistas controladores (...).

As razões para que as partes tenham contratado dessa forma podem ter sido inúmeras. Basta ver que o próprio acordo de acionistas existente entre os alienantes do controle desde 2002 aparentemente não diferenciava ações ordinárias de ações preferenciais, para efeito de direito de preferência e tag along entre os controladores. Portanto, a oferta de qualquer preço aos controladores, por suas ações ordinárias, teria determinado a extensão desse mesmo preço às ações preferenciais de que fossem titulares.

A própria SRE (...) concluiu que o pagamento pela Ofertante de valores idênticos pelas ações ordinárias e preferenciais dos antigos controladores decorreu de condição negocial, nada indicando que a diferença entre o preço de mercado das ações preferenciais e o valor que foi por elas pago significasse na verdade parcela de preço que corresponderia às ações ordinárias.

Essa conclusão me parece a mais razoável diante das características do caso, inclusive porque considero que se deve, em princípio, presumir a veracidade de contratos firmados”.[55]

Concluindo que o preço das ações preferenciais sem voto foi aumentado artificialmente, com o objetivo de diluir o preço das ações na OPA, a CVM deverá, tal como nas demais hipóteses em que não se confirma o tratamento equitativo, indeferir o pedido de registro da OPA.

Vale salientar que a manipulação no preço de venda das ações preferenciais não é o único meio de se reduzir indevidamente o preço de compra das ações dos minoritários na OPA. Essa redução fraudulenta pode ocorrer, só para citar alguns possíveis exemplos, por meio de outras operações paralelas,[56] assunção de dívidas do vendedor e até mesmo pela ocultação de parte do preço nos documentos apresentados pelo ofertante, exigindo a atenção da CVM e dos minoritários.[57]

11. OPA unificada visando a mais de uma das finalidades previstas na Instrução 361/02

A OPA por alienação de controle é apenas uma das modalidades de ofertas públicas de aquisição de ações. A LSA e, no caso das companhias listadas nos segmentos especiais da B3 (Nível 1, Nível 2 e Novo Mercado), os respectivos regulamentos de listagem contemplam outras ofertas públicas de aquisição de ações, que se dividem em dois gêneros: obrigatórias e voluntárias.

Ofertas obrigatórias são aquelas impostas por lei ou, no âmbito das companhias listadas nos segmentos especiais da B3, por disposição estatutária, em que o ofertante estará obrigado a formular a oferta por determinação legal ou estatutária. Nesses casos o preço das ações não será livremente fixado pelo ofertante, devendo observar o que determina a lei ou o respectivo regulamento do segmento especial de listagem. Há quatro modalidades de ofertas obrigatórias: (i) a OPA para cancelamento de registro, assentada no § 4º do art. 4º da LSA, (ii) a OPA por aumento de participação, prevista no § 4º do art. 4º da LSA, (iii) a OPA para saída do segmento especial de listagem, quando prevista no estatuto social da companhia, e, finalmente, (iii) a OPA por alienação de controle.

São voluntárias as ofertas formuladas pelo proponente a seu exclusivo critério, segundo termos e condições que desejar. Constituem espécies do gênero de ofertas voluntárias[58] (i) a OPA para aquisição de controle de companhia aberta, disciplinada pelo art. 257 da LSA, e (ii) a OPA concorrente, referida no art. 262 da mesma lei.

Em algumas situações, o ofertante pode ter a necessidade ou obrigação de realizar, dentro de um curto período, mais de uma OPA. Isso pode ocorrer, por exemplo, quando o adquirente do controle, antes mesmo de comprar as ações do bloco de controle, realiza compra significante de ações no mercado, ensejando a realização da OPA por aumento de capital, ou quando, após assumir o comando da companhia, deseja fechar seu capital, estando obrigado a formular a OPA para cancelamento de registro.

Atento a esses casos, o art. 34, § 2º, da Instrução 361/02 estabelece que o Colegiado da CVM pode autorizar a formulação de uma única OPA, visando a mais de uma das finalidades previstas na instrução, contanto que dois requisitos sejam observados: (i) a OPA unificada permita compatibilizar os procedimentos das ofertas abrangidas, e (ii) a unificação das ofertas não cause prejuízos para seus destinatários.[59] O ofertante que queira ou esteja obrigado a formular mais de uma oferta pública, com finalidades distintas, poderá solicitar à CVM o lançamento de uma única oferta, com evidente economia de custo e tempo. Tal unificação, em matéria de alienação de controle, tem sido comum, geralmente envolvendo a unificação da OPA por alienação de controle com a OPA para cancelamento de registro[60] ou com a OPA por aumento de participação.[61] Há também casos envolvendo a unificação de mais de duas ofertas, sobretudo a OPA por alienação de controle, a OPA para saída do Novo Mercado e OPA para cancelamento de registro.[62]

No que se refere ao preço da OPA unificada, de modo a não causar prejuízos aos minoritários, o ofertante em geral terá de calcular qual seria o preço de cada uma das ofertas separadas, e lançar a oferta única pelo preço mais elevado. Por exemplo, se a OPA unificada envolve uma oferta por alienação de controle e outra para cancelamento de registro, o preço por ação deverá ser o maior entre: (i) o preço correspondente a 80% (oitenta por cento) do valor pago por ação do bloco de controle; ou (ii) o preço calculado pelo valor justo da companhia, que é o critério previsto em lei para o cálculo do preço das ações na OPA para cancelamento de registro.[63]

Há situações, no entanto, em que não haverá simplesmente uma diferença no preço por ação calculado segundo o critério de cada OPA. É possível que haja diferenças também na forma de pagamento. Exemplificativamente, o preço das ações pelo critério da OPA para cancelamento de registro pode ser menor do que o preço da OPA por alienação de controle, mas os prazos de pagamento serem distintos: o preço da OPA para cancelamento de registro devendo, em consonância com a LSA, ser pago à vista, e o preço da OPA por alienação de controle, espelhando eventual parcelamento negociado no contrato de alienação de controle, devendo ser pago de forma parcelada. Havendo, no contrato de alienação de controle, a previsão de earn-out, pode-se ter um cenário mais intrincado ainda em que o preço à vista decorrente do critério de valor justo, aplicável à OPA para cancelamento de registro, seja, por um lado, superior à parcela à vista da OPA por alienação de controle, mas, por outro, inferior ao preço total que deverá ser pago se as condições do earn­-out vierem a se confirmar e ensejarem o pagamento de parcela futura.

O Colegiado da CVM recentemente se deparou com essa questão no caso envolvendo a oferta pública unificada de aquisição de ações da Elekeiroz S.A. em decorrência da alienação de controle e do cancelamento do seu registro de companhia aberta.[64] O contrato de alienação de controle previa o pagamento de uma parcela à vista e uma ou mais parcelas variáveis, que somente seriam devidas se determinados eventos futuros e incertos viessem a ocorrer. O adquirente de controle se dispôs a  oferecer, na OPA unificada, duas opções para o pagamento do preço aos minoritários: (1) em atendimento às regras da OPA por alienação de controle, o equivalente a 80% (oitenta por cento) pago por ação ao antigo controlador, o que incluía parcela à vista e uma ou mais parcelas variáveis sujeitas a eventos futuros e incertos; ou (2) em atendimento às regras da OPA para cancelamento de registro, um montante superior ao valor máximo indicado no laudo de avaliação da companhia, a ser pago à vista. A escolha caberia aos minoritários. A questão é que o preço decorrente do valor justo calculado com base no laudo de avalição era superior ao montante que a ser pago à vista de acordo com as regras da OPA por alienação de controle, mas inferior ao valor total que seria devido caso o earn-out se confirmasse e as parcelas variáveis viessem a ser pagas.

Ao analisar o caso o Colegiado da CVM entendeu, por maioria, que o preço na OPA unificada deveria, cumulativamente, atender aos requisitos das duas ofertas, de modo que o montante a ser pago à vista deveria, em qualquer hipótese, corresponder a, no mínimo, o valor justo. Na linha de raciocínio que prevaleceu no Colegiado, a possibilidade de o ofertante incluir mais de uma opção de pagamento na OPA unificada não altera essa conclusão. Segundo a decisão, a “OPA Unificada é uma oferta única; consequentemente, não se pode satisfazer os requisitos de uma modalidade de OPA em uma opção e os da outra em outra opção. Em todas as opções apresentadas aos minoritários deve-se assegurar o direito de receber, no mínimo, o valor justo de que trata o art. 4º [da LSA].”

Em voto divergente, o então Diretor Gustavo Borba sustentou que o ofertante poderia apresentar as duas opções de pagamento, sem garantir, nas duas, o direito ao recebimento do valor justo, já que a preservação dos interesses dos destinatários da oferta, em consonância com o disposto no § 2º do art. 34 da Instrução 361/02, se dá com a concessão de opção para que possam escolher como querem vender suas ações.

Estamos de acordo com a posição adotada no voto divergente. O § 2º do art. 34 estabelece que o ofertante pode formular uma OPA única desde que não haja prejuízo para os destinatários da oferta. Na medida em que são oferecidas as duas opções, acompanhadas, naturalmente, de todas as informações pertinentes para a tomada uma decisão refletida, não haverá qualquer prejuízo aos minoritários. Caso um minoritário opte por vender suas ações de acordo com a sistemática da OPA por alienação de controle e o earn-out não venha a se confirmar, não nos parece que seria correto afirmar que ele foi prejudicado pela unificação das ofertas, posto que a escolha pela venda dentro daquela sistemática coube a ele. No mais, nessa situação o controlador alienante também terá recebido o mesmo valor por ação pago ao minoritário, acrescido do sobrevalor admitido pelo art. 254-A. Como bem colocado por Gustavo Borba, a compatibilização dos procedimentos das ofertas e a preservação dos interesses dos minoritários “deve-se dar por meio da opção entre um dos dois valores, não se garantindo, s.m.j., um sistema híbrido (espécie de hedge) para aquele que optar pelo critério do valor de alienação de controle.” O objetivo do § 2º do art. 34, como sua redação deixa claro, é o de evitar que os minoritários venham a ser prejudicados por conta da unificação das ofertas, e não o de assegurar necessariamente o melhor das duas (ou mais) ofertas.

Enfim, havendo discrepâncias que envolvam simultaneamente o preço e a forma de pagamento, entendemos que não haverá prejuízo aos minoritários caso, na OPA unificada, o ofertante conceda a eles o direito de optar entre alternativas que respeitem as regras de formulação de preço das respectivas ofertas.

12. Aquisição de ações durante o período da OPA

O art. 15-B da Instrução 361/02, acrescentado pela Instrução 487/10, dispõe que o preço por ação na OPA não poderá ser inferior ao maior preço por ação pago pelo ofertante ou pelas pessoas a ele vinculadas em negócios realizados durante o período da OPA.

Dessa forma, caso, após a publicação do edital da OPA, o ofertante ou pessoa a ele vinculada venha a comprar ações abrangidas pela OPA, por preço superior àquele previsto no edital, deverá o ofertante aumentar o preço da OPA. Conforme prevê o § único do art. 15-B da Instrução 361/02, tal aumento deverá ser realizado em vinte e quatro horas a contar da compra das ações por preço superior, mediante a modificação do instrumento da OPA.

13. Código Brasileiro de Governança Corporativa e considerações finais

Por força do art. 254-A da LSA, consagrou-se, no Brasil, o tratamento equitativo entre controladores e minoritários votantes nas alienações de controle: o adquirente está obrigado a formular uma oferta pública para a compra das ações dos minoritários, por preço no mínimo igual a 80% do valor pago por ação do bloco de controle. Perfaz-se, assim, a socialização (parcial) do prêmio de controle.

As preocupações em torno do tratamento conferido aos minoritários na alienação de controle no Brasil, todavia, não se restringem à lei. Muito por conta dos altos prêmios de controle praticados no País, o direito ao tag along foi alçado à condição de prática prioritária de governança corporativa. Como já visto, as companhias listadas nos segmentos do Novo Mercado e do Nível 2 da B3 devem prever em seus estatutos que, ocorrendo alienação de controle, o preço de compra das ações votantes dos minoritários deve ser igual ao preço por ação pago ao controlador alienante.

Essa questão também foi tratada no Código Brasileiro de Governança Corporativa de Companhias Abertas de 2016, elaborado pelo Grupo de Trabalho Interagentes com a coordenação do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, um compêndio de diversas recomendações práticas de boa governança corporativa. Uma das recomendações do Código é justamente a extensão da OPA por alienação de controle a todos os minoritários, com a socialização total do prêmio de controle.[65],[66]

A CVM terminou por acolher essas recomendações ao baixar a Instrução 586, de 8 de junho de 2017, exigindo que as companhias abertas divulguem, anualmente, o informe sobre o Código Brasileiro de Governança Corporativa. No modelo “pratique ou explique”, as companhias devem indicar no informe se adotam ou explicar o motivo pelo qual não adotam cada uma das regras de governança corporativa do Código. Em relação à alienação de controle, devem indicar se atribuem aos minoritários, no tag along, preço por ação igual ao preço pago por ação do bloco de controle, ou explicar o motivo pelo qual não seguem tal recomendação.

Embora a LSA ainda consagre a socialização apenas parcial do prêmio de controle, o tratamento igualitário entre o controlador e o minoritário na alienação de controle ganha cada vez mais força como boa prática de governança corporativa.

Referências

BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 13. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2012.

CANTIDIANO, Luiz Leonardo. Reforma da lei das S.A. comentada. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.

CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. v. 4, tomo II.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. v. 2.

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MARCILIO, Rodrigo. Oferta pública de aquisição de ações por alienação de controle acionário. 2006. Dissertação (Mestrado em Direito), Universidade de São Paulo, São Paulo.

PARENTE, Norma Jonssen. Mercado de capitais. 2. ed. São Paulo: Thomson Reuters, 2018.

PENNA, Paulo Eduardo. Alienação de controle de companhia aberta. São Paulo: Quartier Latin, 2010.

PENNA, Paulo Eduardo; PINHO, Luisa Shinzato de. Preço contingente em operações de fusões e aquisições (M&A): a cláusula de earn-out. In: HANSZMANN, Felipe (Org.). Atualidades em Direito Societário e Mercado de Capitais, volume II. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017.

PRADO, Roberta Nioac. Oferta pública de ações obrigatória nas S.A. – tag along. São Paulo: Quartier Latin, 2005.

SIQUEIRA, Carlos Augusto Junqueira de. Transferência do controle acionário: interpretação e valor. Niterói, RJ: FMF Editora, 2004.




[1] “Art. 254-A - A alienação, direta ou indireta, do controle de companhia aberta somente poderá ser contratada sob a condição, suspensiva ou resolutiva, de que o adquirente se obrigue a fazer oferta pública de aquisição das ações com direito a voto de propriedade dos demais acionistas da companhia, de modo a lhes assegurar o preço mínimo igual a 80% (oitenta por cento) do valor pago por ação com direito a voto, integrante do bloco de controle.
§ 1º - Entende-se como alienação de controle a transferência, de forma direta ou indireta, de ações integrantes do bloco de controle, de ações vinculadas a acordos de acionistas e de valores mobiliários conversíveis em ações com direito a voto, cessão de direitos de subscrição de ações e de outros títulos ou direitos relativos a valores mobiliários conversíveis em ações que venham a resultar na alienação de controle acionário da sociedade.
§ 2º - A Comissão de Valores Mobiliários autorizará a alienação de controle de que trata o caput, desde que verificado que as condições da oferta pública atendem aos requisitos legais.
§3º - Compete à Comissão de Valores Mobiliários estabelecer normas a serem observadas na oferta pública de que trata o caput.
§4º - O adquirente do controle acionário de companhia aberta poderá oferecer aos minoritários a opção de permanecer na companhia, mediante o pagamento de um prêmio equivalente à diferença entre o valor de mercado das ações e o valor pago por ação integrante do bloco de controle.
§ 5º - Vetado”.

[2] Demonstra-se esta situação com o seguinte exemplo: a Companhia A tem suas ações cotadas em bolsa a R$ 40 cada. O alienante vende essas ações por R$ 50 (25% a mais do que o valor em bolsa), capturando um prêmio de controle de R$ 10. O preço da OPA a posteriori corresponderá a 80% do valor pago por ação do controle, ou seja, R$ 40. Consequentemente, o alienante faz jus a todo o prêmio de controle.

[3] Aparentemente não houve qualquer critério objetivo para a escolha do limite de 80%. Tal percentual parece ter sido adotado apenas para conciliar as posições antagônicas do grupo que desejava o retorno do tratamento igualitário previsto no revogado art. 254 com aquele que preferia não ver restaurado o direito de saída conjunta, ao menos em bases igualitárias. Conforme arguta observação de Roberta Nioac Prado, “[q]uis o legislador agradar ‘gregos e troianos’” (Oferta pública de ações obrigatória nas S.A. – tag along. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 112.).

[4] O § 2º do art. 9º da Instrução 361/02 estabelece que a CVM apreciará o pedido de registro dentro do prazo de 30 dias. A fluência desse prazo será interrompida caso a CVM venha a formular exigências ao ofertante. Neste caso, a CVM concederá prazo de até 60 dias para o cumprimento da exigência. A Instrução 361/02 ainda determina que o leilão pelo qual os minoritários deverão manifestar sua aceitação deverá ocorrer no prazo mínimo de 30 dias a contar da publicação do edital.

[5] PRADO, op. cit., p. 235.

[6] Veja-se, a título exemplificativo, a decisão do Colegiado no Processo CVM RJ 2007/3296.

[7] Cláusula 2.5 do Edital da Oferta, registrada na CVM sob o n. CVM/SRE/OPA/ALI/2007/009 em 28.12.2007.

[8] Cláusula 1.4.1 do Edital da Oferta, registrada na CVM sob o n. CVM/SRE/OPA/ALI/2008/006, em 12.09.2008.

[9] Cláusula 2.1 do Edital da Oferta, registrada na CVM sob o n. CVM/SER/OPA/ALI/2010/002, em 23.03.2010.

[10] A área técnica assim se pronunciou: “Por oportuno, ressaltamos que em processos anteriores a área técnica tem considerado como taxa que reflete o custo de oportunidade o CDI, a Taxa Selic e a variação do IPCA+6,7%, sendo predominante a taxa DI. Finalmente, na determinação de um balizador para esta área técnica, cabe citar a decisão recente da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, fixando a taxa Selic como taxa de juros aplicável em caso de descumprimento de obrigação civil (...)”.

[11] Art. 29, § 7º, da Instrução 361/02: “Nas alienações com pagamento em dinheiro, o preço da OPA deve ser, ao menos, igual a 80% do preço pago ao controlador, acrescido de juros à taxa Selic ou, caso esta deixe de ser calculada, outra taxa que venha a substituí-la, desde a data do pagamento ao controlador até a data da liquidação financeira da OPA”.

[12] Item XIV da Resolução 401/76: “Se a venda das ações do acionista controlador for contratada com pagamento a prazo, o adquirente do controle poderá optar pela oferta aos acionistas minoritários de pagamento à vista, em valor que corresponda ao preço unitário contratado, com o acionista controlador, descontado à taxa de juros em vigor no mercado financeiro considerada adequada pela Comissão de Valores Mobiliários”.

[13] CANTIDIANO, Luiz Leonardo. Reforma da lei das S.A. comentada. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 248.

[14] § 1º do art. 4º da Instrução 361/02: “Sem prejuízo do disposto no inciso V, a OPA poderá, se isto não violar outros dispositivos desta Instrução, ter preços à vista e a prazo distintos para os mesmos destinatários, desde que a faculdade de escolha caiba aos destinatários, haja justificada razão para sua existência, e tal distinção não afete a reflexão e a independência da decisão de aceitação da OPA, como, por exemplo, se estiver vinculada ao prazo de aceitação ou à quantidade de aceitações já manifestadas”.

[15] MARCILIO, Rodrigo. Oferta pública de aquisição de ações por alienação de controle acionário. 2006. Dissertação (Mestrado em Direito), Universidade de São Paulo, São Paulo, p. 154. No mesmo sentido, PRADO (op. cit., p. 237).

[16] Considerando que a obrigação é oferecer o preço parcelado, nada impede que o preço à vista, voluntariamente oferecido como alternativa, seja inferior ao que resultaria do desconto do valor parcelado a juros de mercado, como decidiu a CVM no Processo CVM RJ 2003/5464, em reunião do Colegiado realizada em 14.07.2003.

[17] No mesmo sentido, Carlos Augusto Junqueira de Siqueira: “O tratamento equitativo a ser estendido aos minoritários não se restringe ao preço: a disposição legal alcança integralmente as condições do negócio contratado, especialmente prazos e garantias” (SIQUEIRA, Carlos Augusto Junqueira de. Transferência do controle acionário: interpretação e valor. Niterói, RJ: FMF Editora, 2004, p. 442).

[18] A respeito do earn-out, veja-se PENNA, Paulo Eduardo; PINHO, Luisa Shinzato de. Preço contingente em operações de fusões e aquisições (M&A): a cláusula de earn-out. In: HANSZMANN, Felipe (Org.). Atualidades em Direito Societário e Mercado de Capitais, volume II. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017, p. 359 a 379.

[19] O Código Civil de 2002 reforçou esse entendimento, ao consignar, no seu art. 318, que são nulas as convenções de pagamento em moeda estrangeira, bem como para compensar a diferença entre o valor desta e o da moeda nacional, salvo nos casos previstos em legislação especial.

[20] PRADO, op. cit., p. 190.

[21] Foi essa a solução adotada na OPA por alienação de controle indireto da Embratel Participações para o Grupo Telmex, ocorrida em 2004, cujo edital foi aprovado e registrado pela CVM sob o n. CVM/SER/OPA/ALI/2004/002.

[22] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. v. 2, p. 318.

[23] Não procede o entendimento de Nioac Prado, que sustenta que, na alienação por etapas, “caso o preço atribuído às ações seja distinto nos diferentes momentos, há que se atentar para obrigar a extensão da oferta pública aos minoritários quando do pagamento do maior preço, ou seja, daquele no qual o prêmio do valor de controle está embutido no preço das ações” (PRADO, op. cit., p. 210).

[24] Processo CVM RJ 2015/8340.

[25] Segundo o adquirente do controle, a primeira das três etapas não deveria ser levada em conta, já que, naquele momento, não havia a intenção de adquirir o controle. Para o adquirente, portanto, a primeira etapa era uma operação independente e desvinculada da posterior operação de aquisição do controle.

[26] PRADO, op. cit., p. 210.

[27] Confira-se, nesse sentido, o Processo CVM RJ 2006/3881, referente à alienação do controle indireto de Plascar Participações Industriais, deliberado pelo Colegiado em 12.11.2006, e também o Processo CVM RJ 2006/7658, envolvendo a Elektro Eletricidade e Serviços.

[28] BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito societário. 13. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2012, p. 56.

[29] A doutrina, de forma unânime, ressalta a complexidade do cálculo do preço da OPA nas alienações de controle indireto. Veja-se, por todos, CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. v. 4, tomo II, p. 182.

[30] Tal realidade já foi reconhecida pela CVM, no voto de sua então Presidente Maria Helena Santana no Processo CVM RJ 2008/0252, deliberado em reunião de 04.03.2008: “Não ignoro o fato de que o preço de qualquer negociação é livremente estabelecido pelas partes e que, justamente por isso, não raro, o preço pago por uma companhia não corresponde exatamente à soma de todos os seus ativos”.

[31] Art. 29, § 6º, da Instrução 361/02: “No caso de alienação indireta do controle acionário: I - o ofertante deverá submeter à CVM, juntamente com o pedido de registro, a demonstração justificada da forma de cálculo do preço devido por força do art. 254-A da Lei 6.404/76, correspondente à alienação do controle da companhia objeto; e II – a CVM poderá, dentro do prazo previsto no § 2º do art. 9º, determinar a apresentação de laudo de avaliação da companhia objeto”.

[32] O § 6º do art. 29 da Instrução 361/02 alude à alienação indireta do controle, o que, a nosso ver, abarca a alienação de controle indireto.

[33] EIZIRIK, Nelson; GAAL, Ariadna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de capitais – regime jurídico. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2011, p. 618-619.

[34] Processo CVM RJ 2007/1996.

[35] Voto proferido em reunião do Colegiado da CVM de 21.03.2007.

[36] Processo CVM RJ 2007/11573

[37] EBITDA, um dos indicadores financeiros mais utilizados pelo mercado, é o acrônimo de earnings before interest, taxes, depreciation and amortization, também conhecida no Brasil como LAJIDA: lucro antes dos juros, impostos, depreciação e amortização.

[38] Em seu voto na operação envolvendo a alienação de controle indireto da Arcelor Brasil, o então Presidente da CVM Marcelo Trindade extraiu do caso algumas balizas com o objetivo de orientar o mercado e a CVM em casos futuros a respeito da definição do preço da OPA em alienações de controle indireto:
“ii. a justificação do preço pode ser feita, em quaisquer casos, por instrumentos contratuais, se houver, ou outros documentos que comprovem com razoabilidade a parcela do preço correspondente à companhia controlada, como o prospecto ou o edital da oferta, devendo o preço resultante de tais documentos ser aceito pela CVM, salvo prova definitiva da existência de uma parcela adicional de preço não indicada, caso em que a oferta somente será registrada se tal parcela for desde logo acrescida ao preço;
iii. se a CVM entender que existem indícios de que o preço informado nos documentos não é o verdadeiro, não poderá negar registro à oferta, devendo iniciar investigação em paralelo e, ficando comprovada a fraude, formular acusação, inclusive frente ao intermediário, sem prejuízo da indenização a ser postulada pelos destinatários da oferta;
iv. na ausência de instrumentos contratuais ou outros documentos que comprovem a parcela do preço correspondente à companhia controlada, o ofertante poderá justificar o preço por ele indicado por outros meios, cabendo à CVM examinar tais justificativas, e obter outros elementos que lhe permitam chegar a uma conclusão quanto a ter sido feita a adequada demonstração do preço; e
v. se os elementos apresentados pelo ofertante e colhidos pela CVM forem insuficientes, e as ações da companhia controlada e da companhia controladora tiverem liquidez em mercados regulados, o critério de comparação dos preços de mercado das ações de ambas as companhias antes do lançamento da oferta, ou do anúncio negócio de aquisição, deve ser considerado um critério justificado para a demonstração do preço, e pode ser adotado pela CVM.”

[39] Processo CVM RJ 2008/0252, tratado na reunião do Colegiado de 04.03.2008.

[40] Processo CVM 19957.001656/2017-25, examinado pelo Colegiado da CVM em reunião de 02.05.2018.

[41] PARENTE, Norma Jonssen. Mercado de capitais. 2. ed. São Paulo: Thomson Reuters, 2018, p. 531.

[42] Memorando 17/2018-CVM/SER/GER-1.

[43] A CPFL-R fazia parte do Novo Mercado, de modo que o preço por ação na OPA deveria ser igual ao preço pago por ação do controle.

[44] No caso da CPFL-R, o Colegiado também examinou o papel do laudo de avaliação, confirmando que sua finalidade é o de auxiliar na avaliação da DJP. Consignou que, resultando de um trabalho independente e técnico, o avaliador tem o direito de dar o seu trabalho encerrado mediante a entrega, não sendo obrigado a realizar ajustes com os quais não esteja de acordo. Reconheceu, no entanto, como exposto no voto do Presidente Marcelo Barbosa, que “a CVM terá plena liberdade para, caso considere que o laudo não atendeu à finalidade para a qual foi requerido, informar ao ofertante a respeito da situação, para que este possa decidir as medidas que pretende tomar com o objetivo de cumprir a exigência consistente na demonstração da forma de cálculo do preço (...)".

[45] A respeito da diferença entre alienação de controle indireto e alienação indireta de controle, veja-se PENNA, Paulo Eduardo. Alienação de controle de companhia aberta. São Paulo: Quartier Latin, 2010, pp. 125 a 129 e 138 a 140.

[46] Tendo o adquirente que suportar, ainda que indiretamente (já que o risco direto é da companhia objeto), a possibilidade das perdas, o preço a ser oferecido pelo adquirente ao alienante será, em princípio, menor do que seria caso o risco fosse assumido pelo alienante.

[47] SIQUEIRA, op. cit., p. 488.

[48] Art. 29, § 8º, da Instrução 361/02: “Nas alienações cuja contraprestação sejam valores mobiliários, o adquirente deve ofertar aos acionistas valores mobiliários da mesma espécie e classe daqueles oferecidos ao acionista controlador, sendo-lhe facultado formular oferta alternativa em dinheiro ou outros valores mobiliários, desde que a escolha caiba aos destinatários da oferta.

[49] Art. 4º, V, da Instrução 361/02: “Na realização de uma OPA deverão ser observados os seguintes princípios: (...) V – a OPA será lançada por preço uniforme, salvo a possibilidade de fixação de preços diversos conforme a classe e espécie das ações objeto da OPA, desde que compatível com a modalidade de OPA e se justificada a diferença pelo laudo de avaliação da companhia objeto ou por declaração expressa do ofertante,quanto às razões de sua oferta diferenciada”.

[50] Vejam-se, a esse respeito, os seguintes pareceres proferidos pela Superintendência Jurídica da CVM na vigência do art. 254 da LSA: Parecer/CVM/SJU n. 030/82, de 28.04.1982, e Parecer/CVM/SJU n. 015/87, de 18.06.1987.

[51] Nesse sentido, dispõem os arts. 166, VI, e 187 do Código Civil: “Art. 166 – É nulo o negócio jurídico quando: (...) VI – tiver por objetivo fraudar lei imperativa”; “Art. 187 – Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.

[52] A correção dessa distorção exige que, para fins do cálculo do preço das ações na OPA, seja adicionado ao preço pelo qual o alienante do controle vendeu as suas ações ordinárias o sobrepreço pago pelas ações preferenciais. De acordo com a fórmula proposta pela Superintendência Jurídica da CVM no Parecer/CVM/SJU n. 030/82, cuja aplicação a outros casos, por óbvio, depende de um exame das circunstâncias concretas, seria necessário, primeiramente, subtrair do preço pago por cada ação preferencial a respectiva cotação média da ação no mercado, determinando-se, desse modo, o sobrepreço pago por essas ações. Em seguida, a soma total dos sobrepreços seria dividida pelo número de ações votantes objeto da negociação, chegando-se, assim, à parcela do prêmio de controle subtraído, que deverá integrar o cálculo do preço das ações dos minoritários na OPA.

[53] Aliás, como bem aponta Nioac Prado, no Brasil as ações preferenciais têm, em geral, uma maior liquidez do que as ações ordinárias, o que muitas vezes lhes confere uma maior cotação em bolsa de valores (PRADO, op. cit., p. 285).

[54] Processo CVM RJ 2007/3296.

[55] A CVM chegou a uma igual decisão no caso envolvendo a alienação do controle indireto da Vivo Participações à Telefónica, acordada em julho de 2007 (Processo CVM RJ 2011/2092, decidido pelo Colegiado da CVM em reunião de 17.03.2011).

[56] Por esse motivo, Nioac Prado recomenda que “qualquer operação paralela à venda de controle, realizada entre as partes, deveria, ao menos em tese, ser analisada a fim de identificar outras fórmulas que os contratantes podem ter encontrado para se furtarem à incidência do art. 254-A da LSA de 1976” (PRADO, op. cit., p. 285).

[57] Convém transcrever, pela sua pertinência ao tema, o seguinte trecho do voto proferido por Marcelo Fernandez Trindade no Caso Arcelor Brasil (Processo CVM RJ 2007/1996): “Também mecanismos outros, como, por exemplo, a assunção de dívidas do vendedor, podem ser utilizados para camuflar parcela do preço, tanto em ofertas por alienação indireta como direta. Tais hipóteses, como todas as hipóteses de fraude, devem ser tratadas como exceção, e por meio próprio: havendo evidência documental do pagamento de parcela suplementar de preço, como ocorre na hipótese da assunção de dívida do vendedor pelo comprador, tal parcela oculta deve ser desde logo incluída no preço pela CVM, quando da análise do pedido de registro da oferta”.

[58] Note-se que a OPA voluntária pode ser vista tanto como gênero de oferta facultativa, abrangendo, nesse caso, a OPA para aquisição de controle e a OPA concorrente, quanto como espécie. Neste caso, a OPA voluntária seria aquela que, não se enquadrando nas ofertas obrigatórias, não teria por fim a aquisição do controle da companhia, nem é realizada em concorrência com outra oferta. Nem a LSA e nem a Instrução 361/02 contêm regras específicas para a OPA voluntária como espécie, devendo o proponente respeitar, na sua formulação, as normas gerais previstas na Instrução.

[59] Como destacado pela Diretora Ana Novaes em seu voto no Processo CVM RJ 2012/5652, objeto de deliberação na reunião do Colegiado de 06.11.2012, esses dois requisitos “são complementares, cuidando o primeiro dos aspectos formais (procedimentos), e o segundo dos resultados concretos da unificação (substância).

[60] Veja-se, a título de exemplo, o Processo CVM RJ 2006/0338, objeto de deliberação na reunião do Colegiado de 21.03.2006, no qual foi autorizada a unificação da OPA por alienação de controle do Banco BEC com a OPA para cancelamento do registro de companhia aberta.

[61] A título exemplificativo, reportamo-nos ao Processo CVM RJ 2005/0225, decidido na reunião do Colegiado realizada em 19.04.2005, que envolveu a Companhia Siderúrgica de Tubarão.

[62] É o caso, por exemplo, da OPA unificada da companhia Tivit Terceirização de Processos, Serviços e Tecnologia, objeto do Processo CVM RJ 2010/11232, decidido na reunião do Colegiado realizada em 16.11.2010.

[63] Na OPA unificada do Banco BEC (Processo CVM RJ 2006/0338), mencionada anteriormente, prevaleceu o preço decorrente do cancelamento de registro, posto que superior ao preço calculado pela regra do art. 254-A da LSA.

[64] Processos CVM 19957.007244/2018-80, 19957.007245/2018-24 e 19957.007246/2018-79, que foram objeto de deliberação na reunião do Colegiado realizada em 08.08.2018.

[65]  O item 1.5 do Código adota o seguinte princípio a respeito das mudanças de controle: “Independentemente da forma jurídica e dos termos e condições negociados para a transação que der origem à mudança de controle, todos os acionistas da companhia objeto da transação devem ser tratados de forma justa e equitativa”. Desse princípio, o Código chega à recomendação de que o estatuto da companhia deve estabelecer que “transações em que se configure a alienação, direta ou indireta, do controle acionário devem ser acompanhadas de oferta pública de aquisição de ações (OPA) dirigida a todos os acionistas, pelo mesmo preço e condições obtidos pelo acionista vendedor”.

[66] Essa recomendação já constava do Código de Melhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC, que era editado pelo IBGC antes do Código Brasileiro de Governança Corporativa – Companhias Abertas.

 

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