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Controle Minoritário no Direito Brasileiro

Controle Minoritário no Direito Brasileiro

Controle Minoritário no Direito Brasileiro

(Versão original publicada na obra coletiva CRISTOFARO, Pedro Paulo; MACHADO FILHO, Caio (coords.). Direito Empresarial: Estudos Contemporâneos – Grupo de Direito Empresarial da PUC-Rio. Rio de Janeiro: Quartier Latin, 2017.)


Paulo Eduardo Penna

dez.2017

1. Introdução

O controle minoritário, em que um acionista ou grupo de acionistas titular de menos da metade das ações votantes controla uma companhia, é fenômeno ainda relativamente recente no Brasil. Embora, a doutrina[1] e até a legislação brasileira tenham dele tratado desde os anos setenta, o controle minoritário era, até alguns anos atrás, uma questão mais teórica do que prática. Sua alastrada presença nos mercados acionários norte-americano e europeu contrastava com sua quase completa ausência no Brasil.

É bem verdade que, desde a edição da Lei 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (Lei de Sociedades Anônimas ou, simplesmente, “LSA”), pratica-se no Brasil outra espécie de controle minoritário tendo por referência não o capital votante, mas o total. Em sua redação original, o § 2º do art. 15 da LSA permitia que até 2/3 das ações de uma companhia fossem preferenciais sem direito a voto (ou voto restrito), o que possibilita que um acionista titular de tão somente 16,67% do total das ações tenha a maioria das ações votantes e, assim, controle a companhia. Esse tipo de controle minoritário ainda é comum. A Lei 10.303, de 31 de outubro de 2001, alterou o § 2º do art. 15 da LSA, dispondo que, em companhias novas ou que optem por abrir seu capital, o número de ações preferenciais sem direito a voto não pode ultrapassar 50% do total das ações emitidas. Nesse novo cenário, alcança-se a maioria do capital votante com a titularidade de apenas 25% mais uma do total das ações emitidas pela companhia.

O tipo de controle descrito acima difere do controle exercido com menos da metade das ações votantes. Neste caso, dentre os acionistas titulares de ações com direito a voto, há um acionista – ou grupo de acionistas – que, por conta da alta dispersão do capital da companhia e do absenteísmo dos demais acionistas, alcança a maioria dos votos nas assembleias gerais mesmo sem possuir a maioria das ações votantes.

O aparecimento do controle minoritário fundado na titularidade de menos da metade das ações votantes, como fenômeno recorrente, está ligado ao advento do Novo Mercado, um dos segmentos especiais de listagem da BM&FBovespa. Criado em dezembro de 2000, o Novo Mercado adotou a regra do “one vote, one share” (uma ação, um voto), admitindo à listagem apenas companhias com o capital dividido em ações ordinárias. Com o boom de abertura de capitais de empresas no Brasil a partir de 2004, o Novo Mercado, com o mais elevado padrão de governança corporativa dos segmentos de listagem na BM&FBovespa, torna-se o segmento preferido dos investidores. Em ofertas primárias ou secundárias realizadas no Novo Mercado, vários controladores, sem poder usar o mecanismo de ações preferenciais sem voto para, com a titularidade de uma pequena fração do capital, assegurar o controle da companhia, aceitaram ter sua participação acionária diluída para menos da metade do capital votante. Apesar da participação reduzida, mantiveram, não obstante, o controle da companhia.

No presente artigo examinamos o controle minoritário baseado na titularidade de menos da metade das ações votantes e as questões jurídicas que suscita, em especial a obrigatoriedade da oferta pública no caso de alienação de controle. Exceto se indicado de forma diversa, quando nos referirmos a controle minoritário ao longo do artigo estamos tratando deste tipo de controle.

 2. Caracterização do controle minoritário

A expressão ‘controle da companhia’ é ambígua e, no direito societário brasileiro, dependendo do seu uso, significa ‘poder de controle’ ou ‘bloco de controle’[2].

Poder de controle é, segundo a lição de José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho, “o poder supremo da estrutura hierárquica da companhia exercido pelo acionista controlador – titular da maioria pré-constituída dos votos na Assembléia Geral”[3]. Apesar das diferentes conotações atribuíveis à palavra ‘controlar’ no direito societário[4], pode-se conceituá-la, de modo geral, como dirigir ou pilotar. Poder, por sua vez, significa a capacidade que tem um agente de produzir um resultado, impondo a sua vontade perante outro agente, sem que haja, contudo, relação de subordinação. A noção de poder sempre se dá em vista da relação de um agente com outro.

O conceito de poder de controle adquire relevância no direito societário a partir da comprovação – objeto da célebre pesquisa de Adolf A. Berle e Gardiner C. Means que deu origem ao livro The modern corporation & private property[5], cuja primeira edição data de 1932 – do fenômeno da dissociação nas companhias entre a propriedade da riqueza produtiva (compartilhada entre todos os acionistas, proporcionalmente à sua participação acionária) e o seu controle (em geral detido por um acionista ou um grupo de acionistas), que revoluciona a forma de se organizar empreendimentos produtivos.

Nas sociedades anônimas, o poder de controle se manifesta, primordialmente, nas assembleias gerais dos acionistas, por meio do voto. Exerce o poder de controle aquele que, nas assembleias gerais, consegue fazer prevalecer a sua vontade sobre os demais acionistas, dirigindo as atividades sociais por meio da escolha dos seus administradores e da definição das linhas de sua atuação. O poder de controle é uma situação de fato.

Já as ações detidas em conjunto pelo acionista controlador constituem o ‘bloco de controle’. Fala-se em ‘bloco’ porque esse agrupamento de ações é tratado como coisa coletiva, e ‘de controle’ porque, sendo titular desse bloco, o acionista logra, por meio do voto proferido nas assembleias gerais, exercer o poder de controle[6]. Do bloco de controle emana o poder de controle.

Berle e Means[7], sob o enfoque do direito norte-americano, e depois, no Brasil, Fábio Konder Comparato[8], buscaram classificar as formas pelas quais o controle é exercido. A partir de suas lições, chegamos às seguintes modalidades de controle exercidas com base nas ações votantes da companhia: totalitário, majoritário e minoritário.

O controle totalitário se dá quando a totalidade das ações se concentra nas mãos de um único acionista ou grupo de acionistas, vinculados por acordo de votos. Inexiste qualquer dissociação entre propriedade e controle: o único controlador é o único proprietário. Não há que se falar, nesse caso, por óbvio, nas variadas questões que envolvem o por vezes intrincado relacionamento entre controlador e acionistas minoritários.

A segunda modalidade de poder de controle é a majoritária. Ocorre quando há um acionista ou grupo de acionistas proprietário da metade mais uma das ações votantes, com base nas quais consegue fazer prevalecer a sua vontade nas assembleias gerais da companhia, independentemente da atuação dos demais acionistas votantes. Constitui o primeiro passo para a dissociação entre a propriedade e o controle.

Há situações, no entanto, como mencionado de início, em que um acionista ou grupo é capaz de controlar a sociedade sendo detentor de menos da metade das ações votantes. Trata-se do controle minoritário. Esse fenômeno torna-se viável quando há uma grande pulverização das ações em circulação, muitas vezes conjugada com um elevado absenteísmo dos acionistas nas assembleias[9]. Os acionistas titulares da maioria do capital votante simplesmente não comparecem às assembleias gerais, por estarem interessados apenas nos direitos econômicos das ações. Ou, ainda que compareçam, sendo detentores de pequenas frações do capital, não conseguem se articular para atuar de modo coordenado. Como, de modo geral, a vontade social se forma pela maioria dos votos dos acionistas presentes nas assembleias, esse cenário propicia que um acionista ou grupo titular de um bloco de ações inferior à maioria do capital votante consiga, de modo reiterado, fazer prevalecer sua vontade nas deliberações assembleares e eleger a maioria dos administradores.

A par das modalidades de controle exercidas com base na titularidade acionária, a doutrina aponta, ainda, a existência do controle gerencial e do controle externo[10]. O controle gerencial sobrevém quando, ante a extrema pulverização do capital, os administradores da companhia terminam por comandá-la, principalmente com base na obtenção de procurações públicas (proxies) dos acionistas para representá-los nas assembleias, conseguindo, em muitos casos, perpetuar-se no poder. O controle externo, por fim, é aquele exercido por entidades fora da estrutura da sociedade, tais como grandes credores, aos quais se assegura, por meio de contratos restritivos, o poder de influir nos rumos da sociedade. Não constitui propriamente um poder de controle, mas um modo de influenciar o controle[11].

A maior parte das companhias abertas brasileiras sempre esteve sujeita ao controle majoritário, nas mãos de grupos familiares ou financeiros (ainda que os controladores detivessem menos da metade do capital total, em decorrência da estrutura acionária fortemente baseada na emissão de ações preferenciais sem voto). Foi somente com a chegada do Novo Mercado e o boom de aberturas de capital na década de 2000 que várias companhias passaram a ter controle minoritário. Já em 2008 o Novo Mercado contava com 33 companhias cujo maior acionista ou grupo controlador tinha menos do que a metade do capital votante[12]. Segundo levantamento que fizemos mais recentemente, em setembro de 2014 esse número tinha aumentado para 62.[13]

O controle gerencial, frequente nos Estados Unidos, ainda encontra-se em estágio embrionário no Brasil. Já há entre nós algumas companhias que declaram não ter um controlador definido, e cujo maior acionista detém menos de 10% das ações votantes[14]. Seria necessário um estudo de cada uma dessas sociedades para verificar se ainda estão submetidas a um controle acionário minoritário – conquanto exercido por acionista detentor de parcela ínfima do capital votante –, ou se já estão realmente sujeitas a um controle gerencial.

Não há propriamente um número de ações votantes a partir do qual um acionista consiga, nas companhias sem um acionista majoritário, exercer o controle minoritário. Tal número dependerá, naturalmente, da dispersão do capital da companhia.

Dependerá, também, do arranjo de forças entre seus acionistas. Pode-se separar os acionistas de uma companhia aberta em dois grandes grupos. De um lado temos os acionistas com atuação mais ativa, que, por sua vez, se dividem em dois subgrupos: os controladores, e os chamados ‘ativistas minoritários’, que, embora não integrando o bloco de controle, adotam uma atuação proativa, participando das assembleias e cobrando transparência, resultados e o respeito a seus direitos, seja pela via administrativa (Comissão de Valores Mobiliários - CVM) ou judicial/arbitral. Do outro lado, há os acionistas passivos que apenas acompanham as informações públicas das companhias e compram e vendem ações. Esses acionistas passivos, por vezes também apelidados de ‘rendeiros’, são meros investidores de mercado, sem interesse, tempo ou capacidade para se envolver nas deliberações sociais. Conforme apontaram Lamy Filho e Bullhões Pedreira, em clássico artigo em defesa das ações preferenciais publicado no Jornal do Brasil durante as discussões sobre o anteprojeto que viria a resultar na LSA, esses acionistas passivos esperam que o controlador e os administradores “mantenham a companhia próspera e respeitem seus direitos” e, se isso não ocorre, “alienam suas ações, investem em outras companhias ou se retiram do mercado”[15].

Quanto mais pulverizado o capital social e menor a presença de ativistas minoritários, o número de ações necessário para controlar a companhia tende a ser menor. Um maior número de ativistas minoritários na companhia é um componente que altera esse equilíbrio, porquanto os ativistas, além de maior capacidade fiscalizatória, estão mais dispostos ou preparados para se articular com outros acionistas ou tomar medidas para desalojar o controlador.

Os países da União Europeia consideram que há controle minoritário a partir do percentual de aproximadamente 30% das ações votantes, ao estabelecer, nos termos da Diretiva 2004/25/CE, que o investidor que adquirir esse percentual de ações[16] está obrigado a formular uma oferta pública para a aquisição das ações dos demais acionistas, no pressuposto de que terá ocorrido a aquisição de controle. A literatura empírica anglo-saxã em geral emprega o percentual de 20% para, em companhias com capital disperso, caracterizar um acionista como controlador[17]. Na prática, o percentual necessário para exercer o controle vai variar de companhia para companhia e pode até ser menor.

Mesmo que, em tese, uma sociedade anônima fechada possa ter controle minoritário, este tipo de controle é próprio das companhias abertas. A típica companhia fechada tem poucos acionistas, muitas vezes ligados por laços familiares ou empresariais, e a maior parte deles se faz representar nas assembleias gerais. Terminam, assim, estando sujeitas a um controle totalitário ou majoritário.

 3. Regime jurídico do controle minoritário

A LSA não define o que é controle. O que a lei faz é definir, no seu art. 116, acionista controlador:

“Art. 116. Entende-se por acionista controlador a pessoa natural ou jurídica, ou o grupo de pessoas vinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, que:

a) é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, a maioria dos votos nas deliberações da assembléia-geral e o poder de eleger a maioria dos administradores da companhia; e

b) usa efetivamente o seu poder para dirigir as atividades sociais e orientar o funcionamento dos órgãos da companhia.”

São três os elementos necessários para identificar o acionista controlador: preponderância, permanência e uso do poder. Acionista controlador é aquele que detém um número de ações suficiente que lhe permita, nas assembleias gerais, fazer prevalecer a sua vontade perante os demais acionistas e eleger a maioria dos administradores da companhia. Tal preponderância não deve ser transitória, intercambiando a cada assembleia; a eventual prevalência do acionista em uma assembleia não o torna, automaticamente, controlador da companhia. É preciso que esse poder de controle seja exercido de forma estável, em caráter permanente, embora a LSA não estabeleça critérios demarcatórios do que será considerado exercício permanente de poder. Por fim, exige-se o efetivo uso dessa preponderância nas assembleias gerais. Não basta alguém ser titular da maioria das ações votantes para ser considerado controlador da companhia. Se um acionista não comparece às assembleias, relegando as decisões societárias à minoria dos acionistas presentes, não será, para os fins do art. 116, tido como controlador, mesmo que proprietário da maioria absoluta das ações votantes.

Similar definição é atribuída pelo art. 243 da LSA[18] à sociedade controladora, no âmbito dos grupos de sociedades, porém sem referência ao requisito do efetivo uso do poder de controle previsto na alínea ‘b’ do art. 116. Esse requisito, esclarece Lamy Filho, não consta do art. 243 porque, como assinalado na Exposição Justificativa do projeto da lei, “o efetivo exercício do poder de dirigir as atividades das sociedades controladas (...) se presume nas relações societárias”[19].

O art. 116 também reconhece que o poder de controle pode ser exercido por um grupo de pessoas unidas por acordo de votos ou submetidas a controle comum.

A definição de acionista controlador na LSA é instrumental. Seu propósito principal é definir quem será considerado controlador para os fins do parágrafo único do art. 116, que trata do exercício do poder de controle e dos deveres do acionista controlador perante os demais stakeholders, e do art. 117, que o responsabiliza pelos danos praticados com abuso de poder. Daí porque a lei não considera controlador a pessoa natural titular da maioria das ações votantes, mas que não usa esse poder.

Na medida em que não exige a propriedade de um número mínimo de ações com direito a voto para caracterizar o acionista controlador, o art. 116 abrange não somente os controles totalitário e majoritário, mas também o controle minoritário.

A esse propósito, segundo estatui o art. 129 da LSA, as deliberações da assembleia geral, em regra, serão tomadas por maioria absoluta de votos dos acionistas presentes, não podendo o estatuto da companhia aberta aumentar tal quorum. Excepcionando essa regra, o art. 136 da LSA lista certas matérias cuja aprovação requer o voto de acionistas que representem, no mínimo, metade das ações com direito a voto. Mas, mesmo neste caso, o § 2º do art. 136 prevê que a CVM pode autorizar a redução desse quorum qualificado no caso de companhia aberta com a propriedade das ações dispersa no mercado, e cujas três últimas assembleias tenham sido realizadas com a presença de acionistas representando menos da metade das ações com direito a voto. Esse quadro confirma ser perfeitamente viável que um acionista ou grupo, detentor de menos da metade das ações votantes, comande a companhia.

A grande maioria da doutrina[20] também comunga do entendimento de que o art. 116 alcança o controle minoritário. Veja-se, por todos, a lição de José Alexandre Tavares Guerreiro:

“não se ignora a possibilidade de o poder de controle ser detido por acionista que detenha individualmente menos da metade do capital com direito a voto, pois, seja mediante acordo de acionistas, seja simplesmente em virtude da experiência consagrada na prática das assembléias gerais – marcadas pelo absenteísmo dos acionistas – pode ocorrer de esse acionista controlar a companhia.”[21]

Em posição praticamente isolada, Fran Martins sustentava que o acionista controlador teria que possuir a maioria das ações votantes da companhia, “pois só assim poderá ser assegurada, de modo permanente, a maioria dos votos nas deliberações da assembleia geral”.[22]

A esse entendimento veio aderir Modesto Carvalhosa. Embora, em edições mais antigas dos seus comentários à LSA, tenha defendido que o art. 116 abarca o controle minoritário[23], em edições recentes aderiu de forma enfática à tese de que a LSA não abrange o controle minoritário, por conta da exigência do elemento permanência:

“O poder de controle das companhias somente se configura (...) se for permanente, ou seja, sem nenhuma dependência de outros acionistas para que seja exercido. O poder de controle, portanto, é autônomo e autárquico. Daí a razão por que se estabelece o poder-dever de controle somente quando um ou mais acionistas ostentam, ou então congregam, via acordo de controle, a maioria absoluta do capital votante da companhia (art. 118). Não há pois, em nosso regime legal a figura do ‘controle minoritário’ (...).”[24]

Seguindo esse raciocínio, Carvalhosa argumenta que nas companhias com capital disperso o comando é dos administradores, ainda que reconheça que possa caber a algum grupo de acionistas minoritários, circunstancialmente, eleger o conselho de administração.[25]

Essa posição, a nosso ver, não se sustenta. A realidade mostra que, em muitas companhias com capital disperso, há um acionista (ou grupo) minoritário que de fato comanda a companhia por anos a fio, sem qualquer ameaça concreta ao seu poder. Como já se examinou, a LSA não exige a titularidade da maioria das ações votantes para a caracterização do acionista controlador. Quando o acionista já detém a maioria das ações, o requisito de permanência torna-se irrelevante; aquele que detém a maioria das ações sempre conseguirá fazer prevalecer a sua vontade nas assembleias gerais. O requisito de permanência é necessário para caracterizar o controlador apenas nos casos de controle minoritário. É precisamente nas companhias em que não há um controlador majoritário que um acionista titular de menos da metade das ações votantes pode conseguir a maioria de votos nas assembleias de modo ocasional ou permanente. Apenas se prevalecer nas assembleias em caráter permanente é que será considerado controlador.[26]

Uma interpretação sistemática da LSA também desautoriza a interpretação de que não há controlador minoritário. Como visto, a lei define quem é acionista controlador justamente para responsabiliza-lo nos termos do § único do art. 116 e do art. 117 da LSA. No âmbito desses dispositivos, não teria sentido pretender responsabilizar o acionista controlador titular de, digamos, 60% das ações votantes, mas não o acionista detentor de 40% das ações votantes de uma companhia com capital altamente pulverizado e que há anos dirige a sociedade, fazendo prevalecer sua vontade nas assembleias gerais. Admitir que este controlador de fato não é um acionista controlador de direito subverte o sentido da lei, em prejuízo dos demais acionistas sem poder de mando e dos demais stakeholders. É permitir que o acionista que efetivamente manda e desmanda na companhia não possa ser responsabilizado por abuso de poder de controle.

Se não bastassem esses argumentos, a leitura da alínea ‘b’ do inciso II do art. 137 da LSA estanca qualquer dúvida. Ao definir o que é dispersão, para fins de se afastar do acionista dissidente o direito de retirada, a alínea ‘b’ refere-se expressamente à hipótese em que o acionista controlador detém “menos da metade da espécie ou classe de ações”. Admite, assim, de forma explícita, a existência do controlador minoritário.

A redação do § 5º do art. 243 da LSA também é reveladora. Ao dispor que se presume que há “influência significativa quando a investidora for titular de 20% ou mais do capital votante da investida, sem controlá-la”, o § 5º do art. 243 parece indicar que é possível existir uma controladora detentora de 20% (ou mais) do capital votante da investida.

Reconhece-se que, em determinadas circunstâncias, o elemento permanência dificulta a caracterização do controle minoritário. Em geral, quando um acionista titular de menos da metade das ações exerce o controle há décadas, sem qualquer verdadeira ameaça, não há dúvidas de que há controle minoritário.

As informações prestadas pela própria companhia no Formulário de Referência[27], embora não conclusivas (até porque em geral passam pelo crivo do controlador), também deverão ser levadas em conta. Quando a companhia aponta um acionista (ou grupo) minoritário como seu controlador[28] em geral é porque ele é de fato o controlador. A declaração de que a sociedade não tem um controlador deve ser examinada com mais cautela e confrontada com outros elementos fáticos.

A principal dúvida quanto à existência ou não do controle aparece quando a preponderância nas assembleias é recente ou há outros grupos minoritários fortes que podem ameaçar o controle. Como mencionado, a LSA não estabelece um critério para determinar o que será considerado exercício de controle de modo permanente.

No âmbito da alienação de controle – tema do próximo tópico – essa questão era tratada, na vigência do art. 254 da LSA, pela Resolução 401, de 22 de dezembro de 1976 do Conselho Monetário Nacional (“Resolução 401/76”), que regulamentou a oferta pública obrigatória. Ao definir acionista controlador, a Resolução 401/76 assim dispunha em seu item IV:

“IV - Na companhia cujo controle é exercido por pessoa ou grupo de pessoas, que não é titular de ações que asseguram a maioria absoluta dos votos do capital social, considera-se acionista controlador, para os efeitos desta Resolução, a pessoa, ou grupo de pessoas vinculadas por acordo de acionistas, ou sob controle comum, que é titular de ações que lhe asseguram a maioria absoluta dos votos nas três últimas Assembléias Gerais da companhia.”

A Resolução 401/76 elegia como critério de permanência a maioria dos votos nas três últimas assembleias.

Ainda que este ato não esteja mais em vigor, a preponderância do acionista nas três últimas assembleias gerais pode ser um indicativo dessa permanência[29]. A baliza das “três últimas assembleias”, assentada no já citado § 2º do art. 136 da LSA, de certo modo reforça esse critério. Naturalmente, essa prevalência nas últimas assembleias precisa ser sopesada em conjunto com outras circunstâncias que confirmem a estabilidade do poder de controle. Trata-se de uma presunção relativa.

A LSA consagra assim um regime único de controle, aplicável tanto ao controle majoritário quanto ao controle minoritário. A lei inclusive não se refere a acionista majoritário, mas sim a acionista controlador. Há, assim, na LSA duas categorias de acionistas[30]: o acionista controlador, que pode ser majoritário ou minoritário[31], e o acionista minoritário propriamente dito.

Desse modo, em princípio o controlador minoritário está, pois, obrigado a observar os deveres fiduciários previstos no § único do art. 116 e poderá ser responsabilizado por atos praticados com abuso nos termos do art. 117. Está igualmente obrigado a prestar informações sobre a sua posição acionária na companhia aberta (art. 116-A) e a formular oferta pública para a compra das ações dos minoritários nos casos de cancelamento do registro da companhia aberta (§ 4º do art. 4º). Como seu congênere majoritário, o controlador minoritário não poderá participar das votações em separado para a eleição dos membros do conselho de administração que a lei reserva aos minoritários votantes (art. 141, § 4º, I)[32]  e sem direito a voto ou com voto restrito (art. 141, § 4º, II), nem na eleição dos membros do conselho fiscal reservada para os minoritários (art. 161, § 4º, a).

De modo geral, aplicam-se, ainda, ao controle minoritário, dentre outros, os arts. 122, § único, 162, § 2º, 243 e seguintes, 255, 256, 257 e 264 da LSA, bem como as regras contábeis da LSA pertinentes a sociedades controladoras e controladas.

Também se aplicam ao controle minoritário, como veremos a seguir, as regras da LSA que tratam da alienação de controle de companhia aberta (art. 254-A).

 4. Alienação do controle minoritário e incidência do art. 254-A da LSA

O poder de controlar uma companhia tem valor próprio. As ações que, em conjunto, asseguram ao seu titular o exercício do poder de controle, possuem, reunidas, valor unitário superior ao das demais ações da mesma espécie e classe de emissão da companhia. O valor próprio atribuído a esse bloco de ações decorre da dissociação entre o controle da companhia e a propriedade acionária, objeto da citada pesquisa de Berle e Means[33]. Esse valor próprio se materializa nas transações de controle, notadamente na alienação privada de controle, em que o controlador transfere para um terceiro as ações que, em bloco, possibilitam o exercício do controle sobre a companhia.

Potenciais adquirentes estão dispostos a pagar mais – às vezes muito mais – para comprar um número suficiente de ações que lhes permitam dirigir a companhia. A diferença entre o valor econômico das ações integrantes do bloco de controle e o que o mercado está disposto a pagar por essas ações constitui o valor do poder de controle. A este sobrevalor ou ágio dá-se o nome de ‘prêmio de controle acionário’.

Filiando-se à tese de que o prêmio de controle acionário deve ser repartido – ao menos em parte – entre todos os acionistas, a LSA, em seu art. 254-A, estabelece que na alienação onerosa do controle de companhia aberta o adquirente tem o dever de realizar uma oferta pública para a compra das ações votantes dos demais acionistas, por preço correspondente a, no mínimo, 80% do valor pago por ação integrante do controle. Trata-se do direito de saída conjunta, também conhecido por tag along right, atingido por meio da oferta pública de ações formulada pelo adquirente e dirigida aos minoritários.

A obrigação da repartição do prêmio de controle entre todos os acionistas foi introduzida no Direito Brasileiro pelo art. 254 da LSA, posteriormente revogado pela Lei 9.457/97. Na vigência do art. 254 a repartição do prêmio era total: o adquirente do controle tinha a obrigação de realizar uma oferta de compra das ações dos minoritários (OPA a posteriori) pelo mesmo preço, por ação, pago ao controlador alienante.

Uma das pautas do movimento que buscou reforçar os direitos dos acionistas minoritários no Brasil, o direito de saída conjunta foi restaurado pela Lei 10.303/01, que incluiu na LSA o art. 254-A[34]. A socialização do prêmio de controle, que antigamente era total, passou a ser parcial. Nos termos do art. 254-A, o adquirente está obrigado a fazer uma oferta pública por preço mínimo igual a somente 80% do valor pago por ação com direito a voto integrante do bloco de controle.

Com mais de uma década de vigência, o art. 254-A da LSA se tornou um importante instrumento de proteção dos direitos dos minoritários, tendo suscitado diversas controvérsias[35]. Uma das mais calorosas diz respeito à sua incidência aos casos de alienação de controle minoritário.

A questão não chega a ser novidade. Embora o controle minoritário como fenômeno econômico consolidado seja ainda relativamente recente, essa questão chegou a ser disciplinada na vigência do art. 254. Poucos dias após a promulgação da LSA, o Conselho Monetário Nacional baixou a já mencionada Resolução 401/76, que definiu quem viria a ser considerado acionista controlador minoritário, sujeitando a alienação do controle minoritário ao art. 254.

Atualmente, ainda que nem o art. 254-A da LSA e nem a Instrução CVM 361, de 5 de março de 2002 (“Instrução 361/02”), que regulamenta as ofertas públicas previstas na LSA, façam menção expressa ao controle minoritário ou ao critério de permanência, entendemos que a OPA a posteriori é obrigatória nas hipóteses de alienação de controle minoritário. Potenciais adquirentes do controle de companhia aberta estão dispostos a pagar um prêmio de controle tanto pelo controle majoritário quanto pelo controle minoritário[36] (naturalmente o valor do prêmio pode variar dependendo do tipo de controle, dentre inúmeros outros fatores). Aliás, se não houvesse o pagamento de prêmio de controle nos casos de alienação de controle minoritário, nem haveria a controvérsia aqui tratada, posto que seria inútil falar na socialização desse prêmio. Havendo, pois, a alienação do controle minoritário com o pagamento de um sobrepreço, o adquirente está obrigado a formular oferta pública para a compra das ações dos demais acionistas.

A Comissão de Valores Mobiliários teve a oportunidade de apreciar essa questão no Processo CVM RJ 2009/1956 (o notório Caso Tim Participações), em que se discutiu a suposta alienação do controle minoritário (e indireto) da companhia Tim Participações S.A. Ainda que o Colegiado, por maioria, tenha afastado a incidência do art. 254-A ao caso, três dos quatro votos escritos apresentados atestaram a possibilidade de aplicação desse preceito às hipóteses de controle minoritário[37].

Apenas um diretor, Eli Loria, manifestou-se contrariamente à possibilidade de aplicação do art. 254-A aos casos de controle minoritário, sustentando que o critério de permanência deve ser extraído do número de ações detidas pelo acionista, já que o acionista que exerce o controle de modo minoritário não tem a garantia de que poderá continuar a exercer esse controle no futuro. Loria conclui que só se poderia falar em controle exercido de modo permanente quando o acionista é titular da maioria das ações votantes da companhia:

“se o alienante não possui o poder de controle de forma permanente, ainda que seja o “controlador de fato”, não pode alienar o que não tem e o adquirente não se obriga a realizar a oferta pública de aquisição perante os demais acionistas. Símile, a qualquer um, no caso ao acionista minoritário, não é permitido exigir aquilo a que não tem direito.”

Loria baseia seu raciocínio no entendimento de que a alienação de controle não exige que o alienante exerça o poder de controle. Argumenta que, se há alienação de controle quando o acionista majoritário, que não exerce o poder de controle, vende suas ações a um terceiro, a contrario sensu não há como aplicar o art. 254-A, quando, na mesma companhia, o minoritário que estiver exercendo o controle de fato alienar suas ações para um terceiro.

Nelson Eizirik também defende que o art. 254-A da LSA não se aplica aos casos de controle minoritário[38]. Segundo o autor, só há que se falar em bloco de controle quando o conjunto de ações reunidas engloba mais da metade das ações votantes da companhia, posto que é a única situação em que o seu titular tem assegurado o exercício do poder de controle, independentemente de qualquer outra circunstância. O art. 254-A, sob sua ótica, abarcaria apenas a transferência do controle majoritário:

Somente existe um “bloco de controle”, como uma universalidade que pode ser objeto de negócios jurídicos próprios, se ele for composto por ações representativas de mais da metade do capital votante da companhia, de forma a assegurar ao seu titular, em qualquer circunstância, o exercício do poder de controle.

Nas companhias sujeitas ao controle minoritário, não existe um “bloco de controle”, mas apenas um conjunto de ações com direito a voto que, ocasionalmente, permite ao seu titular – o acionista controlador – exercer as prerrogativas que identificam o poder de controle.

Dessa forma, diante da inexistência de um bloco de controle, não há como ocorrer uma alienação de controle, apta a ensejar a aplicação da regra prevista no artigo 254-A da Lei das S.A., em companhias sujeitas ao controle minoritária ou naquelas que não possuam controlador definido.”[39]

Pela sua linha de pensamento, o acionista que consegue, de modo duradouro, preponderar nas assembleias gerais, não seria detentor do poder de controle, para os fins do art. 254-A da LSA, “mas apenas o exerce em função da dispersão acionária ou do absenteísmo dos demais acionistas”[40].

Discordamos desse raciocínio. Em companhias em que há um alto grau de dispersão das ações, aliado ao elevado absenteísmo dos acionistas, um acionista consegue, em bases permanentes e estáveis, preponderar nas assembleias gerais, sem qualquer risco efetivo de alteração desta situação. O entendimento de que as ações detidas por este acionista controlador não constituem um bloco de controle ignora esta realidade, em prol de um critério objetivo – titularidade da maioria das ações votantes –, sem amparo legal [41].

É verdade que em muitos casos o acionista minoritário só consegue preponderar nas assembleias gerais devido a circunstâncias conjunturais, sem que se possa efetivamente identificar o exercício do controle em bases permanentes. Aliás, na compra das ações desse bloco de controle minoritário, o sobrevalor eventualmente pago dificilmente será alto o suficiente para justificar a realização de uma oferta pública de ações nos termos do art. 254-A[42], visto que o adquirente não terá segurança quanto ao continuado exercício do controle.

Também não há controle minoritário em bases permanentes no exemplo usado por Loria no voto proferido no Caso Tim Participações, para excluir o controle minoritário do campo de incidência do art. 254-A da LSA. Como visto, Loria argumenta que, como há alienação de controle quando o acionista majoritário, que não exerce o controle, transfere a totalidade de suas ações para um terceiro, inversamente, tal evento não se verifica na venda, para um terceiro, das ações do minoritário que de fato estiver exercendo o controle. Concordamos com a conclusão de Loria para o exemplo, mas não quanto à sua extrapolação para todas as demais situações de controle minoritário. No caso narrado, o controle de fato é exercido em paralelo ao que chamamos de controle potencial e, portanto, há um risco verdadeiro, efetivo, de que, a qualquer momento, o acionista majoritário venha a reverter essa situação, assumindo, a partir do exercício do seu voto majoritário, a posição de controlador. O controle exercido nesta situação é, em essência, precário, mesmo que venha sendo exercido, há anos, de modo ininterrupto.

Essas situações diferem, fundamentalmente, daquela em que um acionista proprietário de parcela minoritária das ações é capaz de exercer o controle em bases permanentes, tendo em vista que cada um dos demais acionistas detém, comparativamente, uma fração ínfima do capital social, e em geral opta por não participar das assembleias. Ainda que não haja uma segurança absoluta de que o controle poderá ser exercido para sempre pelo controlador minoritário, há uma grande probabilidade de que, da mesma forma como vinha sendo exercido pelo alienante, continuará a sê-lo pelo adquirente. Como já examinado, dependendo do tamanho do bloco minoritário de controle e do arranjo de forças dentro da companhia, o risco de o novo controlador minoritário vir a perder o controle é muito mais um risco teórico do que um risco real, efetivo. O exercício do controle, nesse contexto, não é ocasional. Tanto que adquirentes em geral pagam ao controlador minoritário um prêmio de controle, já que, com uma boa margem de segurança, sabem que continuarão a exercer o controle.

Considerando que a LSA abarca o controle minoritário e que o art. 254-A da LSA não elege um critério absoluto para a comprovação da alienação do controle, sendo o controle minoritário exercido em bases permanentes, sem que haja alguma circunstância que possa configurar uma efetiva ameaça a essa estabilidade, a sua transferência a um terceiro caracterizará a alienação do controle, obrigando o adquirente a realizar a OPA a posteriori. O bloco de ações minoritário detido pelo controlador constituirá, para todos os efeitos do art. 254-A, um bloco de controle, como, aliás, também concluíram três dos quatro membros do Colegiado da CVM que apresentaram voto escrito no Caso Tim Participações.

No mais, a aplicação do art. 254-A aos casos de controle minoritário está em linha com o fundamento de tal artigo, que é o de repartir o prêmio de controle entre todos os acionistas votantes. Não há motivo para obrigar o adquirente de controle a realizar uma OPA quando adquire o controle de um controlador majoritário, mas não de um controlador minoritário. Em ambas as situações pode haver pagamento de prêmio de controle. Logo, em ambas impõe-se a sua repartição (parcial) entre todos os acionistas.

Sabe-se que a falta de um controlador majoritário em muitas situações dificultará a definição de se houve ou não alienação de controle. O emprego de um critério objetivo, tal como determina a já mencionada Diretiva 2004/25/CE em relação aos países da União Europeia, confere maior segurança à incidência da OPA a posteriori aos casos de alienação de controle minoritário. Entretanto, como adverte Erik Frederico Oioli ao também sustentar a aplicabilidade do art. 254-A aos casos de alienação de controle minoritário, “a dificuldade de aplicação do dispositivo não é motivo para sua não aplicação”[43]. Tendo em vista que a legislação brasileira não prevê um critério objetivo baseado na quantidade de ações, será forçoso examinar, diante das circunstâncias concretas, se o suposto controle minoritário alienado preenche o requisito de permanência, ensejando a OPA a posteriori[44].

A preponderância nas últimas três assembleias é uma presunção relativa, que deve ser avaliada junto com outros fatores. A coexistência do controle potencial ou outros fatores que constituam um efetivo risco ao exercício do poder de controle minoritário impossibilitariam, para os fins do art. 254-A, a confirmação da permanência, eximindo o adquirente das ações de realizar a OPA por alienação de controle. Aliás, justamente por não assegurar ao adquirente segurança quanto ao futuro exercício do controle, é bem possível que nessas aquisições o preço de compra não tenha embutido um prêmio de controle, tornando a discussão quanto à exigência dessa OPA, sob o ponto de vista prático, estéril.

Em suma, será preciso realizar um exame pormenorizado de cada caso, para que seja confirmado que o controle minoritário é exercido em bases permanentes e de que é razoável supor que poderá continuar a sê-lo desta forma. Na falta de confirmação, impõe-se afastar a incidência do art. 254-A da LSA, em vista do seu caráter excepcional[45].

Seguindo essa linha, o eventual reforço do controle minoritário não ensejará a incidência do art. 254-A da LSA. O reforço de controle ocorre quando o acionista (ou grupo) controlador, que exerce o controle minoritário sobre a companhia, adquire ações de acionistas não controladores, com vistas a aumentar o peso do bloco de controle minoritário[46] ou até transmudar o controle em majoritário. Nesse caso, o controle já é exercido pelo controlador minoritário. Não há qualquer aquisição de ações do bloco de controle (na verdade, o bloco já existe no patrimônio do controlador e é aumentado, a título originário, mediante a compra de novas ações) e, portanto, não incide, por óbvio, o art. 254-A.

 5. Diferenças no exercício dos controles majoritário e minoritário

Submetidos ao mesmo regime jurídico, em geral não haverá grandes diferenças no exercício dos controles majoritário e minoritário. Boa parte das normas contidas na LSA busca proteger os acionistas minoritários do poder do controlador e tentar evitar os naturais conflitos de agência decorrentes da existência de acionistas que mandam na companhia, embora não sejam seus únicos proprietários, e de outros que, embora sendo proprietários de uma fração da companhia, não possuem poder de mando. Ausentes nas situações de controle totalitário, tais problemas manifestam-se tanto no controle majoritário quanto no minoritário.

Nos dois casos, o controlador tem meios para usar do seu poder para extrair da companhia os benefícios privados do controle[47], causando danos aos demais acionistas. Conquanto se possa cogitar de que o controlador minoritário terá mais incentivos para se apropriar desses benefícios privados, já que possui um percentual menor do capital, na verdade tal situação não difere muito daquela em que um grande percentual de ações preferenciais sem voto está nas mãos de minoritários, e o controlador, embora possuidor da maioria do capital votante, detém uma parcela minoritária do capital total.

Tanto no controle majoritário quanto no minoritário, pode o controlador abusar do seu poder, praticando atos em benefício próprio ou de terceiros, em prejuízo da companhia e dos acionistas minoritários. Pode até mesmo se revelar um controlador incompetente, impondo medidas que sejam desastrosas para a companhia, ainda que não em benefício próprio.

Também nas duas situações haverá acionistas minoritários que poderão monitorar e fiscalizar os atos do controlador e da administração, questionar, nas assembleias gerais ou por outros meios, as suas decisões e tomar medidas administrativas (perante a CVM) ou judiciais/arbitrais para fazer valer seus direitos e até mesmo responsabilizar o controlador por abusos cometidos[48].

Há, entretanto, uma diferença. Nas companhias com um controlador majoritário ineficiente ou impopular, em princípio só restará aos minoritários as alternativas de vender suas ações, questionar o controlador e, se cabível, tomar medidas administrativas ou judiciais/arbitrais (além de ficar na torcida para que o controlador opte por vender o controle da companhia caso receba uma oferta de compra de um potencial adquirente mais competente). Já nas companhias com um controlador minoritário ineficiente ou impopular, além dessas medidas, os acionistas minoritários podem – ao menos em tese – se organizar para formar um bloco de ações maior do que o bloco de ações detido pelo controlador e, assim, removê-lo do comando da companhia. Também não precisam ficar apenas torcendo para que o controlador decida vender o controle da companhia para alguém mais capacitado; podem gradualmente comprar ações no mercado (escalada em bolsa) ou formular uma oferta de compra das ações de todos os demais acionistas à revelia do controlador (oferta hostil), e assim formar um bloco de ações maior do que aquele detido pelo controlador. Caso o controlador seja mesmo ineficiente, o valor de mercado das ações tenderá a estar abaixo do seu efetivo potencial, facilitando uma escalada em bolsa ou oferta hostil.

A viabilidade da substituição do controlador por meio do exercício do voto, escalada em bolsa ou oferta hostil dependerá de vários fatores, mas principalmente do tamanho do bloco de controle e da existência de outros minoritários ativos com participações relevantes. Em alguns casos, essa substituição pode ser viável; em muitos outros, não. Quanto maior o número de ações detidas pelo controlador minoritário, mais difícil será removê-lo do controle. Com efeito, em geral será mais viável organizar um bloco composto por 22% das ações votantes para retirar do poder um controlador minoritário possuidor de 20% das ações votantes, do que um bloco de 47% das ações votantes para remover um controlador que detenha 45% das ações votantes. Aliás, nesta situação é praticamente impossível remover o controlador do poder, até porque, para se proteger, basta ele comprar uma pequena fração do capital votante e, assim, tornar-se um controlador majoritário (ou chegar muito próximo dessa posição). A presença de minoritários ativistas com participações expressivas facilita a articulação entre os minoritários, que se torna difícil com um capital altamente pulverizado, em que todos os minoritários – exceto o controlador – detêm participações ínfimas.  Além desses fatores, há também vários outros que influenciarão a viabilidade da substituição do controlador, inclusive fatores externos à companhia, como, por exemplo, a disponibilidade de financiamento para ofertas hostis.

Assim, em companhias com controle minoritário, os ativistas minoritários tendem a ter um maior poder de influência[49], o que pode levar o controlador a melhor respeitar (e a fazer com que os administradores melhor respeitem) os direitos dos demais acionistas.

A propensão para adotar medidas contrárias aos anseios do mercado (ainda que o controlador entenda serem em benefício da companhia) também pode variar. Um controlador majoritário provavelmente terá menos receio de tomar uma medida que desagrade ao mercado, posto que, ainda que a medida venha a afetar negativamente o valor das ações, em princípio não corre o risco de perder o controle. Já seu congênere minoritário tenderá a ter mais cautela em tomar uma medida antipática, porquanto, ao menos em tese, pode vir a ser removido do poder por uma articulação dos demais acionistas. O controlador minoritário provavelmente também estará mais preocupado com a influência de medidas impopulares no preço das ações, eis que uma queda no preço pode ser o estopim de uma escalada em bolsa ou oferta hostil.

Enfim, dependendo da estrutura acionária da companhia, o controlador minoritário pode vir a correr o risco de perder o poder. É nesse contexto que, junto com o aparecimento no Brasil de companhias com controle minoritário, surgem as poison pills brasileiras.

 6. Poison pill brasileira: proteção da dispersão acionária ou do controle minoritário?

Ao abrirem o capital no então recém-criado Novo Mercado, diversas companhias passaram a adotar em seus estatutos uma cláusula que logo veio a ser apelidada de “poison pill brasileira”[50]. Embora seus termos variem de companhia para companhia, a poison pill brasileira consiste, de modo geral, em uma cláusula estatuária que obriga o adquirente de determinado percentual de ações (em regra variando de 10% a 35%) a realizar uma oferta pública para a compra das ações de todos os demais acionistas, por um preço definido por fórmulas ou critérios previamente fixados[51].

Conquanto guarde alguma semelhança com a poison pill brasileira, o direito de saída conjunta previsto no art. 254-A da LSA dela difere, pois só se aplica às aquisições derivadas de controle, quando um bloco pré-existente é transferido. Já a poison pill brasileira se aplica às aquisições derivadas, às aquisições originárias de controle (quando o bloco de controle se forma nas mãos do adquirente) e também às aquisições de blocos minoritários expressivos.

A primeira companhia a adotar a poison pill brasileira foi a Natura Cosméticos S.A., por ocasião da sua abertura de capital no Novo Mercado em 2004[52]. A partir desse caso pioneiro, a poison pill brasileira passa a ser adotada por várias outras companhias, principalmente no âmbito do Novo Mercado. Segundo levantamento que fizemos em setembro de 2014, das 131 empresas listadas no Novo Mercado, 68 adotavam a poison pill brasileira[53].

O propósito declarado das poison pills é o de proteger a dispersão acionária. Em companhias com alta dispersão acionária, os acionistas minoritários podem se sentir forçados a vender suas ações diante de uma oferta hostil que tenha por propósito adquirir controle da companhia ou até mesmo um alto percentual de ações, com receio da perda de liquidez das ações e de terem que vender as ações a um preço menor em um segundo momento. As poison pills brasileiras, sob esse prisma, protegem os acionistas contra a natureza coercitiva das ofertas públicas de aquisição de controle, promovem o tratamento igualitário entre os acionistas e conferem a eles maior poder de barganha diante de uma oferta[54]. Também protegem os acionistas da perda de liquidez em uma escalada em bolsa, obrigando o adquirente a realizar a oferta quando atingir o percentual de ações previsto no estatuto (gatilho).

Ocorre que a maioria das companhias brasileiras que adotou essas pílulas em seus estatutos possui um controlador, em geral um controlador minoritário. E, segundo o levantamento citado acima feito com base em dados de setembro de 2014, em mais de 70% dessas sociedades o acionista ou grupo controlador detém um número de ações superior ao gatilho previsto no estatuto para disparar a oferta pública de compra de ações. Nessas situações, sem entrar no exame da legalidade das poison pills brasileiras, o que exigiria um estudo próprio[55], é preciso reconhecer que esse dispositivo termina servindo mais para proteger o controlador minoritário ao encarecer as ofertas hostis ou escaladas em bolsa que poderiam retirá-lo do poder[56]. Nas precisas palavras de Carlos Klein Zanini:

“na ausência de uma diluição efetiva do poder de controle, a poison pill brasileira acabou defendendo precisamente aquilo que originalmente pretendia combater: a manutenção de um bloco de controle concentrado.”[57]

A poison pill brasileira torna-se, assim, uma barreira à troca de controle[58]. Barreira essa que pode inclusive dificultar a própria alienação do controle pelo controlador, dependendo da fórmula ou critério para determinação do preço da oferta fixado na pílula.

A proteção à manutenção do controlador minoritário é em muitas situações reforçada com a adoção de uma cláusula estatutária acessória à poison pill brasileira chamada, sem muito rigor técnico, de cláusula pétrea, que impõe aos acionistas que votarem em assembleia favoravelmente à alteração ou supressão das poison pills a obrigação de realizar uma oferta pública, nos moldes previstos na redação original da pílula. Funciona, assim, como uma trava à eliminação ou mesmo alteração da poison pill brasileira.

A celeuma em torno da cláusula pétrea foi tanta que o Colegiado da CVM proferiu o Parecer de Orientação 36, de 23 de junho de 2009, pelo qual manifestou o entendimento de que esta cláusula não se compatibiliza com os princípios e normas da LSA e que, consequentemente, não aplicará penalidades em processos administrativos sancionadores aos acionistas que votarem pela supressão ou alteração da poison pill e não venham a realizar a oferta exigida pelo estatuto. Em 2011 os Regulamentos do Novo Mercado e do Nível 2 da BM&FBovespa também foram reformados e agora vedam a inclusão de cláusulas pétreas nos estatuto sociais (art. 3.1.2, ‘ii’). Tal proibição, no entanto, não se aplica às companhias que já adotavam tais cláusulas antes da reforma (art. 14.5, ‘ii’). Apesar de sua relevância, o posicionamento da CVM não impede que eventuais acionistas que se sintam prejudicados pela supressão ou alteração da cláusula pétrea recorram, conforme o caso, ao judiciário ou às câmaras arbitrais.

A despeito dos seus objetivos declarados, o fato é que, em companhias com controle definido, as poison pills brasileiras funcionam mais como uma proteção à manutenção do controle do que da dispersão acionária. Ao que tudo indica, foi, em muitas situações, o meio que o controlador totalitário encontrou para abrir o capital da sua companhia no Novo Mercado (que, como vimos, só admite companhias com ações ordinárias) e, desse modo, ter a sua participação acionária diluída para um patamar minoritário sem correr o risco de perder o controle. Ou, ainda que correndo esse risco, assegurar a venda das suas ações por um preço alto no caso de uma oferta hostil ou escalada em bolsa que atingisse o gatilho[59].

 7. Controle minoritário nos regulamentos do Novo Mercado, Nível 2 e Nível 1 da BM&FBovespa

Os regulamentos do Novo Mercado, Nível 2 e Nível 1 de Governança Corporativa da BM&FBovespa estabelecem práticas de governança corporativa adicionais em relação ao que prevê a legislação societária, sendo de observância obrigatória às companhias que venham a aderir esses segmentos especiais de listagem.

Entre as práticas de governança do Novo Mercado e do Nível 2, destaca-se a que se refere ao tag along diferenciado. Nesses dois segmentos especiais de listagem, o adquirente do controle está obrigado a lançar uma OPA para adquirir as ações de todos os demais acionistas por preço correspondente a 100% do valor unitário pago por ação do controle. No Nível 2, tal regra aplica-se inclusive às ações preferenciais sem voto ou com voto restrito, admitidas nesse segmento especial de listagem.

Ao tratar do controle, os três regulamentos abrangem o controle minoritário. Em todos os três, as definições de ‘acionista controlador’ (e, por conseguinte, de ‘acionista controlador alienante’) e de ações de controle são calcadas na de ‘poder de controle da companhia’. Segundo previsto no item 2.1 dos regulamentos, acionista controlador é aquele que exerce o poder de controle. Já ações de controle significam o bloco de ações que assegura ao seu titular o exercício do poder de controle.  A definição de poder de controle está contida no item 2.1 dos regulamentos:

“‘Poder de Controle’ significa o poder efetivamente utilizado de dirigir as atividades sociais e orientar o funcionamento dos órgãos da Companhia, de forma direta ou indireta, de fato ou de direito, independentemente da participação acionária detida. Há presunção relativa de titularidade do controle em relação à pessoa ou ao Grupo de Acionistas que seja titular de ações que lhe tenham assegurado a maioria absoluta dos votos dos acionistas presentes nas 3 (três) últimas assembleia gerais da Companhia, ainda que não seja titular das ações que lhe assegurem a maioria absoluta do capital votante.”

Ainda que não faça referência à preponderância nas assembleias gerais e ao poder de eleger a maioria dos administradores, a primeira frase da definição repete, em essência, a definição de controle que se extrai do art. 116 da LSA. Afinal, só consegue dirigir as atividades sociais e orientar o funcionamento dos órgãos da companhia aquele que obtém a maioria dos votos nas assembleias e nomeia a maioria dos administradores. Tal como o art. 116, os regulamentos condicionam a existência desse poder ao seu uso efetivo e não exigem a titularidade de uma participação mínima de ações para distinguir o controle. São, pelo contrário, até mais explícitos ao consignar que o poder de controle se caracteriza “independentemente da participação detida”.

Os regulamentos repetem, assim, a sistemática da LSA, que previu a existência de um regime único de controle, abarcando tanto o controle majoritário quanto o minoritário, sem estabelecer uma titularidade mínima de ações votantes para a caracterização de controle. A primeira parte da definição de poder de controle, conjugada com as definições de acionista controlador e ações de controle, confere ao controle um conceito similar àquele da LSA[60].

A segunda parte da definição de poder de controle prevê (tal como fazia a Resolução 401/76) que se presumirá que há controle minoritário quando um acionista ou grupo de acionista obtém a maioria absoluta dos votos nas três últimas assembleias gerais. Trata-se de presunção relativa, que deve ser examinada em conjunto com outros elementos que possam confirmar a existência do controle. Se, no âmbito da LSA, na falta de outro critério, a doutrina termina por acolher a baliza das três últimas assembleias para tentar caracterizar o controle minoritário, aqui o emprego dessa mesma baliza é feita por expressa convenção.

Assim, de modo geral o controlador minoritário estará sujeito às obrigações impostas pelos regulamentos do Novo Mercado, Nível 2 e Nível 1 ao controlador majoritário. Dentre outras obrigações, estará, pois, obrigado a observar a política de negociação de valores mobiliários da companhia, tomar medidas em certas situações para recompor o percentual mínimo de ações em circulação, divulgar os valores mobiliários de sua titularidade, fazer cumprir regras aplicáveis à saída da companhia do segmento de listagem, bem como estará proibido de negociar ações nos seis meses subsequentes à primeira oferta pública de distribuição de ações da companhia. No Novo Mercado e no Nível 2, o controlador minoritário também terá que cumprir certas obrigações no caso de alienação de controle, de modo a assegurar que o adquirente do controle realize a oferta pública para a compra das ações dos demais acionistas, e deverá assegurar que, no mínimo, 20% dos membros do conselho de administração sejam conselheiros independentes, sem vínculo com o acionista controlador. Também no Novo Mercado e no Nível 2 estará obrigado a realizar oferta pública de aquisição de ações dos demais acionistas na hipótese de saída da companhia do respectivo segmento de listagem[61] e na hipótese de alienação do controle após a sua saída (neste caso, a oferta deverá ser realizada conjuntamente com o adquirente do controle).

Os regulamentos estabelecem uma distinção transitória do regime jurídico de controle majoritário para aquele de controle minoritário. Como regra geral, os membros do conselho de administração terão mandato unificado de, no máximo, dois anos. No entanto, os regulamentos permitem, em caráter excepcional, que, quando deixar de existir um controlador titular de mais de 50% do capital votante, os membros do conselho sejam eleitos, apenas uma vez, com mandato unificado de até três anos.

O controle minoritário também é tratado no Código de Autorregulação do Comitê de Aquisições e Fusões – CAF, outro fruto recente da autorregulação. O Código de Autorregulação adota a mesma definição de ‘poder de controle’ dada pelo regulamento do Novo Mercado e constrói o significado de acionista controlador a partir dessa definição. Institui, pois, um regime único de controle, que engloba tanto o controle majoritário quanto o minoritário.

No que tange à OPA por alienação de controle, o Código estabelece regra semelhante àquela verificada no Nível 2, impondo ao adquirente do controle (majoritário ou minoritário) a obrigação de realizar oferta para comprar as ações votantes e não votantes dos demais acionistas pelo mesmo preço pago por ação ao controlador alienante.

O Código também encampa uma espécie de ‘poison pill brasileira’, ao exigir que o acionista que adquira percentual de ações igual ou superior ao fixado no estatuto social da companhia, que não poderá ser inferior a 20% nem superior a 30% do capital votante, realize oferta pública de compra de ações de todos os acionistas[62].

 8. Considerações finais

O controle minoritário, como visto, não é propriamente um fenômeno recente no Brasil. A LSA foi declaradamente estruturada para permitir que um acionista, titular de fração minoritária do capital social, detivesse a maioria das ações votantes e, assim, controlasse a companhia. Fenômeno relativamente recente é o controle minoritário fundado na titularidade de menos metade das ações votantes, que somente ganha corpo com o desenvolvimento do Novo Mercado.

Esta espécie de controle minoritário está sujeita, basicamente, às mesmas regras aplicáveis ao controle majoritário. Tal como ocorre com o controle majoritário, a alienação do controle minoritário de companhia aberta obriga o adquirente a realizar oferta pública para a compra das ações votantes dos demais acionistas, nos termos do art. 254-A da LSA. Os regulamentos do Novo Mercado e dos Níveis 2 e 1 da BM&FBovespa seguem o mesmo caminho, estabelecendo, de modo geral, um regime único para o controle, seja ele majoritário ou minoritário.

O eventual risco de vir a ser desbancado por acionista ou grupo de acionistas que, por meio de escalada em bolsa ou oferta hostil (ou até mesmo mediante articulação com outros acionistas), consiga reunir um maior bloco de ações, pode levar o controlador minoritário a adotar um comportamento mais cauteloso ou sensível aos anseios dos demais acionistas, em comparação com seu congênere majoritário. A adoção da poison pill brasileira, dependendo das circunstâncias, mitiga esse risco, funcionando em certos casos com uma barreira à troca do controle feita à revelia do controlador minoritário.

Com a consolidação do Novo Mercado como o principal segmento para as novas aberturas de capital, o controle minoritário exercido com menos da metade do capital votante parece ter vindo para ficar. Reflexo da evolução do nosso mercado acionário, confere mais dinamismo às trocas de controle acionário e traz novos desafios ao operador de direito.

 

  1. Pioneiro nesse estudo no Brasil é o livro clássico de COMPARATO, Fábio Konder. O poder de controle na sociedade anônima. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1976.
  2. PEDREIRA, José Luiz Bulhões; LAMY FILHO, Alfredo. Estrutura da companhia. In: LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões (Coords.). Direito das companhias. Rio de Janeiro: Forense, 2009. v. 1, p. 823.
  3. PEDREIRA, José Luiz Bulhões; LAMY FILHO, Alfredo. Estrutura da companhia. In: LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões (Coords.). Direito das companhias. Rio de Janeiro: Forense, 2009. v. 1, p. 824.
  4. Consulte-se, a esse respeito, COMPARATO, Fábio Konder; SALOMÃO FILHO, Calixto. O poder de controle na sociedade anônima. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 9 e seguintes.
  5. BERLE, Adolf A.; MEANS, Gardiner C. The modern corporation & private property – with a new introduction by Murray L. Weidenbaum and Mark Jensen. New Jersey, Estados Unidos da América: Editora Transactions Publishers, 2005.
  6. PEDREIRA, José Luiz Bulhões; LAMY FILHO, Alfredo. Estrutura da companhia. In: LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões (Coords.). Direito das companhias. Rio de Janeiro: Forense, 2009. v. 1, p. 823, p. 826.
  7. BERLE, Adolf A.; MEANS, Gardiner C. The modern corporation & private property – with a new introduction by Murray L. Weidenbaum and Mark Jensen. New Jersey, Estados Unidos da América: Editora Transactions Publishers, 2005, p. 67 e seguintes.
  8. COMPARATO, Fábio Konder; SALOMÃO FILHO, Calixto. O poder de controle na sociedade anônima. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 83 e seguintes.
  9. A alteração introduzida pela Lei 12.431/11 no art. 127 da LSA, viabilizando a participação do acionista nas assembleias gerais da companhia de modo remoto, poderá diminuir o absenteísmo dos acionistas e, assim, dificultar a caracterização do controle minoritário.
  10. Veja-se, por todos, BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito societário. 11. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 346-347.
  11. BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito societário. 11. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 347.
  12. PELLINI, Patrícia. Controle minoritário (capital difuso). In: IBGC - Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. Governança corporativa: estrutura de controles societários. São Paulo: Saint Paul Editora – Saraiva, 2009, p. 48 a 51.
  13. Levantamento feito com a colaboração dos estudantes João Zanine Barroso e Lucas Mayol de Alvarenga, tendo por base as informações declaradas pelas companhias integrantes do Novo Mercado nos seus Formulários de Referência disponíveis do site da CVM em setembro de 2014.
  14. É o caso, por exemplo, da Companhia Hering, cujo maior acionista, em setembro de 2014, detinha 7,3% das ações ordinárias.
  15. LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. A lei das S.A. (pressupostos, elaboração, aplicação). Rio de Janeiro: Renovar, 1992, p. 192.
  16. O percentual exato varia de país para país. Alguns adotam o de 30% e outros o de 1/3.
  17. LA PORTA, Rafael, LOPEZ-DE-SILANES, Florencio, SHLEIFER, Andrei. Corporate ownership around the world. The Journal of Finance, Vol. LIV, NO. 2, April 1999, p. 477; LEECH, Dennis. Shareholder voting power and ownership control of companies, 2002, p 10. Manuscrito disponível em <http://www2.warwick.ac.uk/fac/soc/economics/research/workingpapers/2008/twerp564a.pdf> (acesso em 16.09.2014).
  18. § 2º do art. 243 da LSA: “Considera-se controlada a sociedade na qual a controladora, diretamente ou através de outras controladas, é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores.”
  19. LAMY FILHO, Alfredo, Caracterização da empresa brasileira de capital nacional a que se refere o art. 177 da constituição. In: LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. A lei das S.A. (pressupostos, elaboração, aplicação). Rio de Janeiro: Renovar, 1992, p. 425.
  20. PEDREIRA, José Luiz Bulhões; LAMY FILHO, Alfredo. Estrutura da companhia. In: LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões (Coords.). Direito das companhias. Rio de Janeiro: Forense, 2009. v. 1, p. 816; COMPARATO, Fábio Konder; FILHO, Calixto Salomão. O poder de controle na sociedade anônima, 4. ed. Forense: Rio de Janeiro, 2005, p. 66-71; VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. Curso de direito comercial 3: Malheiros, 2008, p. 268–270; BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 11. ed. Renovar: Rio de Janeiro, 2008, p. 349; COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito comercial. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, v. 2, p. 288; LUCENA, José Waldecy. Das sociedades anônimas – comentários à lei (arts. 1º a 120), volume 1. Rio de Janeiro: Renovar, 2009. Esta posição é até mesmo compartilhada por juristas que afastam a incidência do art. 254-A da LSA aos casos de alienação de controle minoritário, como é o caso de Nelson Eizirik (EIZIRK, Nelson. A lei das S/A comentada – volume I – arts. 1º a 120. São Paulo: Quartier Latin, 2011, p. 668-669).
  21. GUERREIRO, José Alexandre Tavares. Sociedade anônima. Reorganização societária. Alienação de ações. Alienação de controle direta e indireta: inocorrência. Inaplicabilidade do art. 254-A da lei das sociedades anônimas. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 45, 2009, p. 213.
  22. MARTINS, Fran. Comentários à lei das sociedades anônimas – artigo por artigo. 4. ed. Forense: Rio de Janeiro, 2010, p. 403.  
  23. “(...) será considerado controlador aquele acionista ou grupo minoritário que consiga aglutinar, na assembléia geral, a maioria.” CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, v.2, p. 491-492.
  24. CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, v.2, p. 656.
  25. CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, v.2, p. 657.
  26. Se a intenção fosse abarcar apenas o controle majoritário, a lei teria empregado o termo sempre ou modo eterno, e não permanente, mais apropriado para descrever algo duradouro, estável.
  27. Segundo previsto no Anexo 24 da Instrução CVM 480/09, a companhia deve declarar no item 8.1 do Formulário de Referência quem são seus controladores diretos e indiretos.
  28. É o que ocorre, por exemplo, com a MRV Engenharia e Participações S.A., companhia aberta com ações negociadas no Novo Mercado, que declarou, no Formulário de Referência (re)apresentado em 15.09.2014, ter como controlador uma pessoa física (o fundador da companhia), titular de 33% das ações.
  29. Como se examinará mais adiante, o critério da preponderância nas 3 últimas assembleias é adotado pelos Regulamentos do Novo Mercado, Nível 2 e do Nível 3 da BMF&Bovespa e pelo Código de Autorregulação de Aquisições e Fusões, para estabelecer uma presunção relativa da existência do controle.
  30. O § 3º do art. 109 da LSA reflete a existência dessas duas categorias.
  31.  Pode ser também totalitário (decorrente do controle totalitário), caso em que, como já aludido, não haverá acionista minoritário.
  32. De qualquer modo, nas situações de controle minoritário, a potencial eleição em separado de um membro do conselho de administração pelos minoritários votantes deve ser vista com certo cuidado. Dependendo do número de membros do conselho estabelecido no estatuto, a sistemática de eleição dos seus membros prevista no art. 141 da LSA (voto múltiplo e eleição de membros em votações separadas) pode levar o acionista controlador a não eleger a maioria dos conselheiros. Por conta disso, o § 7º do art. 141 da LSA estabelece que, sempre que a eleição do conselho de administração ocorrer pelo voto múltiplo e os minoritários (votantes e/ou não votantes) exercerem a prerrogativa de elegerem conselheiros, é assegurado a acionista ou grupo de acionistas que “detenham mais do que 50% das ações com direito a voto” o direito de eleger conselheiros em igual número ao dos eleitos pelos minoritários, mais um, independentemente do número de conselheiros que, pelo estatuto social, componha o órgão. Tal dispositivo aplica-se ao controlador majoritário, mas não ao controlador minoritário. Na hipótese de controle minoritário, não faz sentido lógico admitir a eleição em separado de um membro do conselho pelos acionistas votantes “excluído o acionista controlador”, nos termos do § 4º, I, do art. 141, se o suposto acionista controlador, ao fim da eleição, não consegue eleger a maioria dos conselheiros. Ora, se, como dispõe o art. 116 da LSA, só será considerado acionista controlador aquele que é titular de direitos de sócio que lhe assegure, de modo permanente, o poder de eleger a maioria dos administradores da companhia, seria forçoso concluir que, nesse cenário, não há acionista controlador e, portanto, não poderia ser invocado o § 4º, I, do art. 141 para a eleição em separado de um membro do conselho pelos minoritários votantes sem a participação do acionista controlador. Assim, nos parece que, nas situações de controle minoritário em que for solicitado o voto múltiplo (e, possivelmente, a eleição em separado de um conselheiro pelos preferencialistas), só deveria ser admitida a eleição em separado de um membro do conselho pelos minoritários votantes caso o controlador minoritário, a despeito desta eleição em separado, consiga eleger a maioria dos membros do conselho.
  33. BERLE, Adolf A.; MEANS, Gardiner C. The modern corporation & private property – with a new introduction by Murray L. Weidenbaum and Mark Jensen. New Jersey, Estados Unidos da América: Editora Transactions Publishers, 2005.
  34. “Art. 254-A. A alienação, direta ou indireta, do controle de companhia aberta somente poderá ser contratada sob a condição, suspensiva ou resolutiva, de que o adquirente se obrigue a fazer oferta pública de aquisição das ações com direito a voto de propriedade dos demais acionistas da companhia, de modo a lhes assegurar o preço no mínimo igual a 80% (oitenta por cento) do valor pago por ação com direito a voto, integrante do bloco de controle.                   § 1º Entende-se como alienação de controle a transferência, de forma direta ou indireta, de ações integrantes do bloco de controle, de ações vinculadas a acordos de acionistas e de valores mobiliários conversíveis em ações com direito a voto, cessão de direitos de subscrição de ações e de outros títulos ou direitos relativos a valores mobiliários conversíveis em ações que venham a resultar na alienação de controle acionário da sociedade.                                   § 2º A Comissão de Valores Mobiliários autorizará a alienação de controle de que trata o caput, desde que verificado que as condições da oferta pública atendem aos requisitos legais.                                                                              § 3º Compete à Comissão de Valores Mobiliários estabelecer normas a serem observadas na oferta pública de que trata o caput.                                              § 4º O adquirente do controle acionário de companhia aberta poderá oferecer aos acionistas minoritários a opção de permanecer na companhia, mediante o pagamento de um prêmio equivalente à diferença entre o valor de mercado das ações e o valor pago por ação integrante do bloco de controle.§ 5º (VETADO)”
  35. Analisamos o art. 254-A, seu histórico e seus pontos controvertidos no seguinte livro: PENNA, Paulo Eduardo. Alienação de controle de companhia aberta. São Paulo: Quartier Latin, 2012.
  36. Veja-se, a esse respeito, os estudos conduzidos por Mikkelson e Regassa tendo por base o mercado acionário norte-americano (MIKKELSON, Wayne H.; REGASSA, Hailu. Premiums Paid in Block Transactions. Managerial and Decision Economics, Hoboken: NJ: John Wiley & Sons, Ltd., vol. 12, 1991, p. 511-517).
  37. Os três diretores que admitiram a incidência do art. 254-A da LSA aos casos de alienação do controle minoritário foram Eliseu Martins, Maria Helena dos Santos Fernandes de Santana e Otavio Yazbek. A transcrição completa dos votos pode ser encontrada no site da CVM.
  38. EIZIRIK, Nelson. Aquisição de controle minoritário. Inexigibilidade de oferta pública. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de; AZEVEDO, Luís André N. de Moura (Coords.). Poder de controle e outros temas de direito societário e mercado de capitais. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 177-190.
  39. EIZIRIK, Nelson. Aquisição de controle minoritário. Inexigibilidade de oferta pública. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de; AZEVEDO, Luís André N. de Moura (Coords.). Poder de controle e outros temas de direito societário e mercado de capitais. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 186.
  40. EIZIRIK, Nelson. Aquisição de controle minoritário. Inexigibilidade de oferta pública. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de; AZEVEDO, Luís André N. de Moura (Coords.). Poder de controle e outros temas de direito societário e mercado de capitais. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 186.
  41. Aliás, quando quer se referir ao critério objetivo da titularidade da maioria das ações votantes, a LSA o faz de modo expresso (art. 141, § 7º).
  42. Como o art. 254-A da LSA impõe o pagamento de preço correspondente a 80% do preço pago por ação do controle, na prática a oferta pública obrigatória só faz sentido quando o preço pago excede o preço de mercado da ação em mais de 25%.
  43. OIOLI, Erik Frederico. A obrigatoriedade do tag along na aquisição de controle diluído. In: ADAMEK, Marcelo Vieira von (Coord.). Temas de direito societário e empresarial contemporâneos. São Paulo: Malheiros Editores, 2011, p. 323.
  44. Em 2010, a BM&FBovespa tentou introduzir esse critério objetivo no regulamento do Novo Mercado. Sua proposta, declaradamente inspirada na Diretiva 2004/25/CE, não foi, contudo, aprovada pelas companhias participantes desse segmento especial de listagem.
  45. Como argumentamos em outra oportunidade, o art. 254-A da LSA “impõe ao controlador uma limitação ao seu direito de propriedade”, já que proíbe a venda das suas ações a alguém que não tenha disponibilidade ou recursos para comprar as ações votantes dos minoritários, tratando-se, assim, “de uma norma excepcional, que deve ser interpretada de forma estrita.” (PENNA, op. cit., p. 69).
  46. Não cogitamos do reforço de controle quando este já é exercido de forma majoritária. Neste caso, trata-se de mero aumento de participação econômica, porém sem alterar a solidez do controle, já garantido pela titularidade de mais de 50% das ações votantes.
  47. Cunhado pela doutrina estrangeira (no seu original private benefits of control), o termo benefícios privados do controle é usado para se referir a todos os meios pelos quais o acionista controlador se apropria de valores ou recursos da companhia, sem dividi-los com os demais acionistas. Conforme leciona John C. Coffee Jr., tal apropriação pode se dar, dentre outros meios, por salários acima do mercado, transações com a própria companhia em bases não equitativas e insider trading (COFFEE JR., John C. Do norms matter?: a cross-country examination of the private benefits of control. Columbia University School of Law, janeiro de 2001. Manuscrito disponível em: <http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=257613>. Acesso em: 27.09.2014, p. 9.
  48. As situações de controle majoritário e minoritário diferem fundamentalmente de um cenário de controle gerencial, exercido pelos administradores da companhia. Neste caso, eventuais conflitos estarão centrados na relação entre acionistas e administradores, e não entre acionistas controladores e acionistas minoritários, com uma exacerbação dos problemas de agência (se bem que também nas companhias com controlador definido podem surgir problemas com os administradores). Em casos de controle gerencial, em tese é menos difícil destituir os administradores do comando da companhia.
  49. Veja-se, a esse respeito, AZEVEDO, Luís André N. de Moura. Ativismo dos investidores institucionais e poder de controle nas companhias abertas de capital pulverizado brasileiras. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro; AZEVEDO, Luís André N. de Moura (Coords.). Poder de controle e outros temas de direito societário e mercado de capitais, São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 221.
  50. O apelido de poison pill brasileira dado a essa disposição estatutária não é dos mais apropriados. Cunhado nos Estados Unidos, o termo poison pill é lá usado para designar um dos vários tipos de medidas defensivas contra ofertas hostis, mas que, como apontam Francisco Müssnich e Vitor Lobão Melo, “em nada se assemelham com a variação tupiniquim incorporada em alguns estatutos sociais de companhias brasileiras, em evidente confusão de espécie com gênero.” (MÜSSNICH, Francisco Antunes Maciel; MELO, Vitor de Britto Lobão. Análise prática e considerações sobre a realidade e a aplicação das medidas de proteção à tomada hostil de controle nos estatutos sociais das companhias abertas brasileiras (brazilian pills). In: SILVA, Alexandre Couto (Coord.). Direito societário – estudos sobre a lei de sociedades por ações. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 254.
  51. Veja-se o caput da poison pill inserida no estatuto social da Cyrela Commercial Properties S/A Empreendimentos e Participações, companhia com ações negociadas no Novo Mercado: “Art. 50. Qualquer Adquirente de Participação Relevante, que adquira ou se torne titular de ações de emissão da Companhia, em quantidade igual ou superior a 15% (quinze por cento) do total de ações de emissão da Companhia deverá, no prazo máximo de 60 (sessenta) dias a contar da data de aquisição ou do evento que resultou na titularidade de ações em quantidade igual ou superior a 15% (quinze por cento) do total de ações de emissão da Companhia, realizar ou solicitar o registro de, conforme o caso, uma OPA pela totalidade das ações de emissão da Companhia, observando-se o disposto na regulamentação aplicável da CVM, o Regulamento do Novo Mercado, outros regulamentos da BM&FBOVESPA e os termos deste Artigo.” O art. 50 contém ainda onze parágrafos com regras sobre o preço da oferta, penalidades e exceções à exigência de realização da oferta, dentre outras.
  52. PRADO, Roberta Nioac. Desconcentração do poder de controle e poison pills: evolução no mercado de capitais brasileiro. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de; MOURA AZEVEDO, Luís André N. de (Coords.). Poder de controle e outros temas de direito societário e mercado de capitais. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 384-385.
  53. Levantamento feito com a colaboração dos estudantes João Zanine Barroso e Lucas Mayol de Alvarenga, tendo por base os estatutos sociais das companhias listadas no Novo Mercado disponíveis para consulta no site da CVM em setembro de 2014.
  54. Esses benefícios da poison pill brasileira são apontados e examinados por Marcos Barbosa Pinto e Otavio Yazbek, então Diretores da CVM, no Memorando de 14 de abril de 2008 (disponível em <http://www.cvm.gov.br/port/infos/6491-0.asp>, acesso em 26.10.2014), que deu origem ao Parecer de Orientação CVM 36/09, comentado adiante.
  55. A respeito da legalidade da poison pill brasileira, Zanini, por exemplo, entende que a pílula é antijurídica quando empregada em companhias em que o controlador detenha um número de ações superior ao gatilho deflagrador da oferta pública, sob o argumento, dentre outros, que ela cria uma desigualdade entre os acionistas, em violação à regra do § 1º do art. 109 da LSA, na medida em que o controlador, por possuir mais ações do que o gatilho, não seria alcançado pela pílula (ZANINI, Carlos Klein. A poison pill brasileira. In: ADAMEK, Marcelo Vieira Von (Coord.). Temas de direito societário e empresarial contemporâneos, São Paulo: Malheiros Editores, 2011).
  56. Embora a poison pill brasileira seja por vezes também adotada por companhias com controlador majoritário, neste caso é desnecessária para proteger o controle, ao menos enquanto o controlador mantém a titularidade da maioria das ações.
  57. ZANINI, Carlos Klein. A poison pill brasileira. In: ADAMEK, Marcelo Vieira Von (Coord.). Temas de direito societário e empresarial contemporâneos, São Paulo: Malheiros Editores, 2011, p. 264.
  58. Esse entrave – evidente quando o controlador minoritário detém um percentual de ações superior ao número de ações exigido pela poison pill para disparar a oferta – também continua a existir em certas situações em que o controlador minoritário possui um número de ações inferior ao gatilho. Digamos que uma companhia tenha um controlador minoritário com 20% das ações e que o percentual de compra de ações para disparar a obrigatoriedade de realizar uma oferta pública seja de 25%. Um ofertante hostil poderá fazer uma oferta para adquirir 22% das ações e, assim, tentar se tornar o controlador sem se submeter aos efeitos da pílula. Mas como em geral não será difícil para o controlador atingir o percentual de 22% (só tem que adquirir mais 2% ou 3% das ações), o ofertante hostil, para assegurar o controle, provavelmente terá que fazer uma oferta por um número maior de ações, atingindo, pois, o gatilho da poison pill.
  59. Como aponta Lucian Bebchuk, com base no mercado de ações norte-americano, na ausência de proteções contra a tomada hostil “founders would be discouraged from subsequently reducing their holdings and relinquishing the lock on control that comes with concentrated ownership”, de tal modo que “antitakeover are desirable at the IPO stage only because they encourage founders to break up their control blocks” (BEBCHUK, Lucian Arye. Why firms adopt antitakeover arrangements. University of Pennsylvania Law Review, 2003, vol. 152, p. 715. Disponível em < http://www.law.harvard.edu/faculty/bebchuk/pdfs/2003.Bebchuk.AntitakeoverArrangements.pdf> (acesso em 27.09.2014).
  60. Não é correto afirmar, no entanto, que a definição de controle dos regulamentos é exatamente igual à definição de controle da LSA. Há diferenças sutis. Por exemplo, como aqui já mencionado e também examinado em outra oportunidade (PENNA, op. cit., p. 98 e seguintes), o art. 254-A da LSA incide na venda do controle potencial, que se caracteriza quando um acionista detém a maioria das ações votantes, mas não exerce o poder de controle. Embora este acionista não seja o controlador para os fins do art. 117 da LSA, detém ações de controle para os fins do art. 254-A. A sistemática dos regulamentos é diferente. Neles, fica muito claro que só é acionista controlador alienante aquele que efetivamente exerce o poder de controle. Nessa linha, os regulamentos não impõem o tag along quando há alienação do controle potencial (o que em nada afasta a imposição do tag along pela LSA, no que diz respeito às ações votantes, dado que a LSA obviamente prevalece sobre os regulamentos).
  61. Tal oferta é dispensada se a companhia sair do Nível 2 para participar do Novo Mercado.
  62. Na sistemática do Código, essa obrigação fundamenta-se no pressuposto de que, nas companhias com capital pulverizado, a aquisição de percentual variando entre 20% a 30% do capital votante significa aquisição de controle. Tanto que o § 3º do art. 65 do Código dispensa a realização da oferta pública se o acionista já fazia parte do grupo controlador titular de mais de 50% do capital votante quando da adesão da companhia ao CAF. Em outras palavras, dispensa a realização da oferta por acionista já integrante do grupo majoritário controlador, posto que não haverá nesse caso mudança de controle. Também dispensa a realização da OPA quando remanescer na companhia o mesmo acionista controlador que já era titular de mais de 50% do capital votante antes da transação. Nesse caso, o acionista que tiver atingido o percentual de, digamos, 30% conviverá com um acionista titular de mais de 50% das ações votantes, sem qualquer alteração no controle. Por outro lado, exige a realização da OPA no caso de acionista que, quando da adesão da companhia ao CAF, já era titular de 20% a 30% do capital votante, mas venha a adquirir participação acionária votante superior a 50%.

 

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